O PRINCÍPIO DA INCERTEZA…
Os protagonistas desta história de vida do início da década de 60 são um homem idoso, com graves problemas de saúde, e uma bonita rapariga a rondar os 30 anos. Tinham relações de parentesco - tio e sobrinha - e viviam uma relação extraconjugal algo estranha.
Desde
muito nova que a sobrinha visitava a casa de seus tios e, quando cresceu e se
fez mulher, passou a ser cobiçada com outros olhos pelo tio. Que – falando mal
e depressa – “rifou” a sua mulher e iniciou uma relação adúltera com a sobrinha,
promovida a “dona da casa”.
O
tio, machista e altamente desconfiado, vivia em permanente desassossego face ao
“crescimento” da sua jovem amante, cada vez mais bonita e vistosa. E as coisas
pioraram ainda mais quando, por motivos de saúde, sofreu à amputação de uma
perna, o que lhe limitou drasticamente os movimentos.
A
rapariga tinha uma banca de venda de miniaturas aos turistas que visitavam o
Mosteiro de Alcobaça e passou a visitar fornecedores fora da vila. As viagens
que fazia a Lisboa eram um tormento para o velho que, quando a jovem chegava a
casa, a “cheirava” desconfiadamente na pesquisa de qualquer sinal que provasse
algum “desvio” em relação à fidelidade que lhe exigia.
Essa espionagem incluía as malas da jovem que o velho fazia à socapa, quando a rapariga saía do seu quarto, onde vivia praticamente acamado devido às suas maleitas.
Essa espionagem incluía as malas da jovem que o velho fazia à socapa, quando a rapariga saía do seu quarto, onde vivia praticamente acamado devido às suas maleitas.
E
um dia – há sempre “um dia” – encontrou um resto de charuto numa mala de mão da
rapariga. Como ela não fumava só podia ser a “prova” de que afinal “havia
outro”…
Daí até passar à acção foi um relâmpago. Pegou num revólver, chamou a rapariga ao seu quarto, e começou aos tiros.
Daí até passar à acção foi um relâmpago. Pegou num revólver, chamou a rapariga ao seu quarto, e começou aos tiros.
A
jovem viu a morte tão perto que, saltou, rebolou pela cama e pelo chão,
conseguindo fugir do quarto e da casa. Percebeu que estava ferida de raspão
numa perna e num braço mas estava viva… A cena obviamente que deu grande
alarido nas imediações da casa onde viviam mas alguém chamou a polícia e a situação
ficou sob controlo.
O
agressor foi preso, a rapariga tratou-se dos ferimentos das balas, constituiu-se
assistente no processo e contratou um velho e reputado advogado da vila para a
representar nos autos. Está claro que a ocorrência deu origem a animado falatório
na vila e no dia do julgamento a sala do Tribunal estava cheia de mirones. Que
tudo queriam ver e ouvir dum caso de que não havia memória ter acontecido numa
pacata terra como Alcobaça.
O
colectivo de Juízes que julgou o processo apurou todos os pormenores daquela
sórdida história, sendo certo que o réu confessou a cena dos tiros que tinha
levado a efeito para castigar duramente a sua infiel companheira, embora não
tivesse intenção de a matar.
Feita
a prova registou–se a pergunta sacramental do Juiz-Presidente: “O réu tem
mais alguma coisa a alegar em sua legítima defesa?”
O
réu disse alguma coisa entre dentes, olhando para atrás para a sala cheia de
gente. O Juiz percebeu algo de constrangimento na sua atitude e recordou-lhe
que estava acusado de um crime muito grave e se tinha mais alguma coisa a dizer
em sua defesa era aquele o momento. O réu acenou com a cabeça mas disse que não
ia falar porque estava muita gente na sala. Perante
esta atitude o Juiz-Presidente mandou evacuar a sala, o que se fez de imediato. “Então o que tem a dizer mais em sua defesa?”
O
réu respirou fundo e, apontando com um dedo o advogado da sua companheira, disse: “Estou convencido que ali o doutor também teve uma relação com ela”.
O
advogado da queixosa levantou-se de um salto e aos gritos aproximou-se do réu
com nítida intenção de o agredir. Gerou-se um pandemónio na sala e juízes,
Delegado do Procurador da República e funcionários judiciais evitaram males
maiores, conseguindo que o advogado voltasse ao seu lugar sem fazer justiça por
suas mãos. O réu ficou branco como a cal das paredes do velho Tribunal mas
mantinha o dedo esticado em relação ao “outro”…
Depois
tudo se acalmou e foi possível ser lida a sentença, que condenou o velho tio da
ofendida a alguns anos de cadeia. Onde uns dois anos depois veio a falecer.
Esta
história de vida algo invulgar bem podia ter sido o guião para um filme de
Manoel de Oliveira.
E
o título só poderia ser um que, por acaso, até já faz parte do seu longo
património cinematográfico: “O princípio da incerteza”!
JERO
4 comentários:
Sim Jero, era coisinha para um filme aí de umas 4 horas!!!
Grande abraço
Parabéns Jero por mais esta estória passada em Alcobaça.
Não me lembro dela pois só tinha 10 anos.
Bem dava um bom filme mas era com o António Silva e a Beatriz Costa e como eles já estariam velhotes em 60 com actores similares.
Um abraço neste dia de "Inverno" em Maio com chuva e vento com fartura
Olá amigo, gostei desta delicia.
Pergunto-me quantos "principios da incertaza" nos salpicam,nesta já longo caminhar, os caminhos de nossasa vidas.
Abraço do Torcato
Cenas de tribunais?
Sim, de facto, mas são extensões da 'vidinha tuga' (certamente que não só) machista, apropriadora de 'vontades alheias', controladora.
Quando as coisas escapam ao controlo (de modo rela ou imaginário) surgem situações dessas.
E pelo andar da carruagem parece que no nosso País se tem estado a regredir bastante, face às notícias que vamos vendo e lendo nas tvs e jornais dos crimes....
Hélder Sousa
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