quarta-feira, 25 de março de 2020

P1219: ELE CHEGA A TODO O LADO...

Este texto, da autoria do nosso camarigo José Belo, foi recentemente publicado no blogue "Luís Graça & Camaradas da Guiné". Tratando-se de um homem igualmente da nossa casa e de um assunto actual e sabendo que o universo de leitores não é exactamente o mesmo, comsiderámos interessante reproduzir o referido texto, com a devida vénia ao autor e à Tabanca Grande, que o publicou.
Os editores

O CORONA VIRUS
NO CÍRCULO POLAR ÁRTICO

José Belo
Estava quase a convidar os Camaradas para virem isolar-se na minha casa, já bem dentro do Círculo Polar Ártico.

Isolamento? O meu vizinho mais próximo vive a cerca de 300 quilómetros da minha casa…

Desinfecção? O meu vodka caseiro nos seus 94% de teor de álcool torna desnecessário lavar as mäos com desinfectantes de farmácia. Basta, à boa moda do cavador lusitano, cuspir para as mãos de vez em quando!

É certo que a venda de álcool é monopólio do Estado mas o bonito alambique de cobre…  é meu!

Neste extremo do extremo norte da Europa devem existir tantos alambiques como famílias de lapões.

Mas em cobre tão bonito... só o do Lusitano e mais nenhum!

O ditado português "Para lá do Marão mandam os que lá estão" é mais do que óbvio quando, ao quereres comprar o jornaleco diário na cidade principal cá do sítio, que é Kíruna, tens de fazer viagem de carro de 300 quilómetros/ida e mais 300 quilómetros/volta...

A capital Estocolmo está, lá para o Sul, a mais de 1.500 quilómetros daqui.

2/3 da população sueca, em número mais ou menos igual à portuguesa num país geograficamente 14 vezes maior, vive no centro-sul.

Muitas das regras e regulamentos vistos a estas distâncias e limites naturais de milhares de lagos, florestas e montanhas, tornam-se bastante... relativas. Historicamente para bem, mas também para muito mal.

É claro que se não pode beber a maravilhosa bebida, de 'destilações repetidas feita' (e aqui o que mais há é tempo para o fazer), nos tradicionais copos de água aqui usados.

Para encher tais copos para visitantes usa-se a mais infantil vodka de 40% a 50%.

Mas, para os imprescindíveis "fins medicinais",  usam-se pequenas quantidades da multidestilada (a tal!) bem misturada com sumo de limão, de laranja, algum mel e um pau de canela.


Ao luar, entre nevões, até as renas parecem pavões!

Mas, apesar das temperaturas negativas e dos nevões, o vírus também por aqui se passeia. Até agora a situação mais séria por aqui era a referida por um velho ditado lapão: "O problema não está em falares com as árvores da floresta; o problema surge quando elas te respondem!"

Ao olharmos para a situação, tanto quanto à saúde como às consequências económicas mundiais, tudo se está a tornar na tal... tempestade perfeita.

Tanto a Alemanha como a Suécia foram buscar às suas reservas económicas quantias muito superiores a 600 mil milhões de euros (números quase incompreensíveis) para fazerem frente ao impacto inicial da crise.

O que se irá passar no nosso querido Portugal sem recurso a tais "reservas"? A "solidariedade" europeia? O caso italiano veio mais uma vez demonstrar que, quando necessária, ela só existe nos discursos dos políticos.

Também não temos ao dispor as máquinas de fabricar dólares existentes nos Estados Unidos que, na sua dívida descomunal, irão certamente funcionar a todo o vapor, pelo menos até às eleições presidenciais de Novembro.

O tempo perdido pela Administração Norte-Americana a negar o problema poderá vir a ser pago com uma tragédia muito superior à italiana!

Em Key West, Florida, o badalado  Sloppy Joe's Bar tem estado continuamente aberto desde há muitas décadas. Dizia-se mesmo que, a haver uma invasão de extra-terrestres, este viriam certamente sentar-se ao balcão do Bar para beber uns daiquiris bem gelados…

Em 17 de março, por causa do vírus, o bar encerrou as portas!

Continuando com estas notícias "leves" sobre o vírus aqui seguem duas curiosidades suecas:

O governo informou todos os trabalhadores que, se sentirem dores de cabeça, de garganta, se tiverem febre, alguma tosse ou dores musculares, devem ficar em casa. Não é necessária visita ao médico nem qualquer atestado de doença.

Recebem 90% do salário normal. Está-se no período normal de gripes e constipações.

Os infindáveis, e escuros, invernos nórdicos criam sempre algumas "dores musculares"... Quantos irão ficar em casa? É claro que mais vale prevenir do que remediar... quando existem as tais reservas de milhares de milhões.


Tem sido muito avultado o número de médicos e pessoal hospitalar reformado  que se tem apresentado para trabalhar voluntariamente. As autoridades de saúde informaram que só aceitavam voluntários até aos 70 anos de idade...

Ainda poderiam ter sido simpáticos para com os "velhinhos" se tivessem invocado como razão o facto de se preocuparem com os perigos de contágio e saúde dos mesmos. Mas não. A razão apresentada foi a de que o trabalho virá a ser demasiado intensivo e esgotante para idades superiores aos 70 anos...


Ponto final!
Um abraço do
José Belo

sábado, 21 de março de 2020

P1218: REVISTA "KARAS" DE MARÇO

A concentração no local habitual reservava-nos no entanto duas novidades - o número reduzido de participantes (18) e, por via disso, a alteração do local do almoço, que iria realizar-se nas instalações próprias da D. Preciosa, próximo da antiga Pensão Montanha.
E no Café Central começaram a reunir-se os suspeitos do costume, como o José Luís Rodrigues e António Sousa, o casal Pessoa e o JERO. E, como já começa a tornar-se hábito, durante a concentração tivemos ainda a companhia do "residente" Jaime Brandão, cliente habitual do mesmo Café.
Claro que o Agostinho Gaspar não podia faltar... Vemo-lo em conversa com o José Luís Rodrigues e o António Sousa, a que entretanto se juntaram o Joaquim Sousa e o Almiro Gonçalves
O caminho para o local do almoço era um pouco maior que o habitual e o pessoal pôs-se a caminho, com o trio habitual a dar o exemplo - Joaquim Mexia Alves, JERO e Miguel Pessoa.
E o Carlos Santos aproveitou o cenário à volta da casa da D. Preciosa para se emboscar, lembrando velhos tempos...
O Vitor Caseiro não podia falhar - aqui conversando com o JERO. E o Agostinho Gaspar avançou com algumas notícias acerca do estado de saúde do Luís Branquinho Crespo, que continua a sua recuperação - e a quem desejamos um completo restabelecimento.
Como se pode ver pela imagem, as instalações da D. Precioso permitem um maior conforto dos participantes relativamente ao local que tem sido utilizado, embora tendo o inconveniente de não nos proporcionar mais de 40/45 lugares - problema que não se pôs nesta ocasião, dado o número reduzido de participantes (18)... 
Estiveram presentes essencialmente os camaradas que mais regularmente participam nestes convívios, como é o caso do Carlos Manata, Vitor Caseiro, Almiro Gonçalves, Joaquim Mexia Alves e JERO.
Uma perspectiva mais geral da sala, onde podemos ver que, embora com espaço algo limitado, permitiu um ambiente agradável que satisfez os presentes. E, a manter-se este alheamento de parte de alguns dos tabanqueiros e não havendo mais que 40 inscritos, esta parece ser uma opção a manter em próximos encontros.
O cozido esteve ao nível habitual, satisfazendo perfeitamente os presentes - como se pode ver pelo ar concentrado do Joaquim Rolo e do Carlos Santos a atacar o petisco...
O casal Gonçalves - Almiro e Amélia - não podia faltar, claro, e partilhou a mesa com o Carlos Manata e o Vitor Caseiro.
O António Sousa estava igualmente na mesma mesa e, pelas suas últimas presenças, tem mostrado que ultrapassou completamente os problemas de saúde que o afastaram de alguns convívios.
O Joaquim Rolo e o Carlos Pereira foram inscritos como habitualmente pelo Carlos Santos e estes, juntamente com o Joaquim Sousa, têm sido presença habitual nos nossos encontros.
Desta vez, com dezoito presenças, tornou-se ainda mais fácil acertar as contas do almoço no fim da refeição - trabalho assegurado com a habitual competência pelo Vitor Caseiro e Carlos Santos.




segunda-feira, 2 de março de 2020

P1214: JERO, CANDIDATO AO GUINESS... DESDE 1977!


CHEGAR DEPOIS DO ÚLTIMO…

A “SPIRIDON”, revista portuguesa dedicada à corrida, referiu, há já uns bons anos atrás, algumas histórias curiosas de atletas que tinham chegado ao fim das corridas em que tinham participado em condições com alguma coisa de invulgar. No artigo em causa, assinado pelo prof. Mário Machado, são referenciados, entre outros, o norte-americano Thomas Curtis, o etíope Mamo Wolde e o português José Eduardo Oliveira. Este último é por sinal o candidato ao Guiness - alcobacense desde 4 de abril de 1940 - que foi, nem mais nem menos, o protagonista (principal) da história da “SPIRIDON”, aqui e agora reproduzida com mais algum pormenor pois há coisas que só quem passa por elas é capaz de contar.

 Em 1977 - já lá vão quarenta e tal anos - cinco amigos de Alcobaça, entusiastas da corrida a pé, numa altura em que correr pelas ruas fazia parar a maioria das pessoas e chamar “malucos” aos corredores, juntaram-se para ir disputar uma prova “Rio Maior - Marmeleira”.

Os ditos “malucos”, todos eles praticantes recentes da modalidade, resolveram, em cima da hora e à boa maneira portuguesa, ir até Rio Maior.

Um domingo, desse distante ano de 1977, bem cedo, saímos de Alcobaça no meu carro e chegámos ao local da concentração 10 minutos antes do tiro de partida.

Inscrições de última hora, “dorsais” presos com um alfinete - que a organização era pobrezinha - e lá fomos para o meio do pelotão, pois já anunciavam a partida. A precipitação foi tal que nem houve tempo para combinar a táctica...

A partida
Cada qual faria a corrida possível e encontrar-nos-íamos naquele mesmo local para regressarmos a casa. Disse aos meus amigos que iria fazer apenas uns 8 a 10 km, pois não tinha “estudos” nem preparação para mais. 

Tiro de partida e lá vamos nós... Foi tudo tão rápido que pensei imediatamente: “Onde eu me vim meter!”   

O coração batia-me aceleradamente e a fila de corredores alongava-se rapidamente pelas ruas que davam para a saída de Rio Maior. Apenas com algumas centenas de metros percorridos ficaram para trás dois corredores. Eram os últimos, por sinal, ambos de Alcobaça, e já então alvo dos sorrisos dos “mirones” da terra. Curiosamente um dos atrasados era o Artur Borda, então a fazer a sua primeira corrida de grande quilometragem e que, anos mais tarde, veio a ser campeão nacional de maratona. As voltas que o mundo dá...

O outro atrasado, como já devem ter entendido, era eu próprio… E pouco depois o Borda foi andando e fiquei isolado e, irremediavelmente, em último. Mal sabia o que estava para me acontecer daí para a frente...

Respirei fundo e disse para comigo (pois não dá jeito dizer “para os meus botões” porque o equipamento não os tinha): “Calma. Não te enerves. Tu é que tens a chave do carro e não vais ficar em terra.... Daqui a uns quilómetros eles voltam para trás e eu regresso com eles. Faço metade da prova e tudo bem”.

Quase a sair de Rio Maior “via-me”, de vez em quando, reflectido nos vidros das montras e, cada vez que isso acontecia, tentava encolher a barriga. “Mas que figura! Para que é que eu me fui meter nisto?!...” 

E começaram as “bocas” do povo, do bom povo português sempre pronto a “ajudar” os últimos: - Óh “velhinho”, não tens vida p’ra isto! Vai mas é p’ra casa! Olha que os outros já passaram há que tempos!!!

“Acabaram” as casas e eis-me fora da vila, já estoirado mas ainda a correr, pois cruzava-me com gente que vinha fazer as compras e não queria “dar parte de fraco”...

O “carro-vassoura” já não tem “velocidade” para me acompanhar e o homem do volante vai-me convidando para subir... O dito carro, que devia ser de apoio, era uma velha “furgoneta” de ”caixa-aberta”... Olhei para aquilo e pensei: “Estes tipos são malucos! Suado como estou se subo para cima daquilo o menos que me acontece é apanhar uma pneumonia.”

- Vá-se embora que eu cá me hei-de desenrascar...

E foram e eu corri mais um bocadinho... Finalmente fiquei sozinho e passei a andar a passo... Estava quase com a respiração normalizada quando pára junto a mim um “jeep” da GNR. Com ar de gozo o “nosso” cabo convida-me também a subir...

- Obrigadinho, mas eu ia já começar a correr...

E pronto, lá arranquei. Durante 5 minutos consigo aguentar-me a correr e, quando já me preparava para fazer mais um bocado do percurso a passo, pára à minha frente uma camioneta de carreira. Abrem a porta e convidam-me a entrar...

- Obrigado, mas não tenho trocado. Podem seguir...

- “Oh sorte. Já nem se pode ser o último... descansado!” Muitos risos, muito gozo, mas lá me deixaram. Cheguei a uma recta compridíssima - pelo menos assim me pareceu - e dos meus companheiros de corrida, ou melhor, de partida, nada... Tinha passado meia hora, já ultrapassara o risco dos 5 Km’s e comecei a duvidar que a corrida onde estava metido fosse de ida-e-volta. Mais uns minutos de corrida e avistei uma aldeia. Muita gente à porta de uma taberna e, fazendo das fraquezas forças, encolhi a barriga e aumentei a passada...

Quando passei pela taberna foi uma “festa” ... Altos gritos, autênticos berros e insistentes convites para deixar aquela vida de dificuldades: - Eh pá, vem “buber” um copo c´a malta!

- Deixa-te disso, pá.

Não lhes dei troco e tive a sorte de apanhar uma descida para embalar.
- Grandes bêbados - gritei-lhes, aí passados uns 50 metros...

Começava a recuperar a moral quando levei o mais rude golpe até então... Sirenes de batedores da polícia e, de repente, aparece-me, em sentido contrário, uma corrida de ciclismo. Pelotão compacto e eis-me alvo da maior galhofa da manhã. Gritos. Acenos de mão... Mas passaram depressa. “Que vida a minha! Mas afinal onde é que seria a Marmeleira?”

Mais uma corrida e avisto uma velhinha à beira da estrada. - Oh minha senhora, onde é que é a Marmeleira?

- A Marmeleira!? Olhe que a Marmeleira ainda é muito longe...

Bonito serviço! Mas pensando bem... para esta gente do campo tudo é longe. Talvez seja exagero! Já corria desde as nove horas - ou, pelo menos, fazia por isso - no meu relógio eram quase dez horas e da Marmeleira nem cheiro... Passei pelo risco dos 10 km. E animei um pouco. “Quem chega até aqui, vai até ao fim!... Não hei-de desistir!”
Mas, pensando melhor, desistir como? Estava sozinho e dos meus colegas de corrida nem rasto! 


Mais um bocado e chega-se a mim um rapaz montado numa bicicleta. Olha para mim, silencioso, e começa a acompanhar-me. Animei um pouco e estava a voltar ao meu melhor estilo - o “devagar”, pois tenho outro que é o “devagarinho” - quando o “ciclista” me perguntou muito “despachado”:

- Você é desta corrida ou d´outra?

“Também este?”, pensei. Enchi o peito de ar, pois nessa altura já não tinha força para encolher a barriga e disse ao miúdo:

- Não, pá, não sou desta corrida. Sou o primeiro da outra. Os outros vêm aí atrás!...

O miúdo ficou calado e com cara de não estar nada convencido. Mas como não se viam corredores nem à frente nem lá atrás... Deixou-me e foi ver se encontrava os outros... Problema dele e eu lá fui andando... E não é que passado um bocado avisto uma tabuleta com uma palavra milagrosa: “Marmeleira”.

Marmeleira
Saí da estrada principal e minutos depois passei pelo traço indicativo dos 15 km. Parei e nem queria acreditar no que os meus olhos viam- faltavam 3 km para a Marmeleira mas eram sempre a subir. Aparecia finalmente ao longe o casario da vila da Marmeleira mas a ladeira que faltava percorrer tinha uma inclinação incrível. Sozinho, desgraçado e exausto reuni as minhas últimas forças para insultar os organizadores. “Que bandidos - terminar uma corrida com uma subida daquelas!”

Arranquei para a terrível subida e mais vergonhas estavam para me acontecer... Começava finalmente a avistar alguns atletas que tinha visto de relance duas horas antes, na altura da partida. Vinham a descer a terrível subida que me faltava, uns de carro, outros a pé, sorridentes por já terem acabado e verem ainda um “coxo” naquelas dificuldades.

E eis que avisto uma cara conhecida, de Alcobaça. Recebi finalmente umas palavras de estímulo e o anúncio de que falta pouco. Estou a chegar ao fim da subida e, já dentro da Marmeleira, a 18 km de Rio Maior, sinto-me satisfeito e espantado de ter conseguido chegar até ali. Agora o terreno já é plano e vejo uma tabuleta que diz “campo de futebol- meta”. Começo a sprintar, entro no campo de futebol e vejo, ao fundo, dois indivíduos, com braçadeiras da organização, a retirar o pano da meta...


Corri o mais que pude mas já não cheguei a tempo... Passei o risco da chegada … já sem o pano da meta!

Protestei, quase chorei... mas os homens da organização iam-me dizendo com ar de espanto:

- Olhe que o último já chegou...

E, como conclui, no seu artigo da “SPIRIDON” o prof. Mário Machado “o pobre do Oliveira tinha chegado depois do último!”

E agora digo eu:
- Depois de todos estes anos não é tempo de reparar tamanha injustiça?! Oliveira para o Guiness... já!!!

          José Eduardo Oliveira - m.f.f.*
             *meio fundista falhado

PS-1/ Além de todas as peripécias desse dia guardo ainda uma boa recordação de um gesto bonito dos meus colegas de corrida alcobacenses: ganharam uma taça na classificação por equipas e ofereceram-ma. Ainda há poucos dias a vi e dei-lhe um jeito na prateleira do meu escritório. Vou pôr-lhe uma legenda: “chegar depois do último não é para todos”.

PS-2/ Assaltou-me agora uma terrível dúvida: “será que me ofereceram a taça por eu – na altura - ter a chave do carro?!

PS-3/ Por causa das dúvidas nunca perguntei - nem vou perguntar!
JERO