segunda-feira, 30 de agosto de 2021

P1308: HOMENAGEM AO JOSÉ EDUARDO REIS OLIVEIRA (JERO)

Estive hoje em Alcobaça participando na Missa e na homenagem que o jornal “O Alcoa” quis prestar a diversas pessoas que se destacaram nas suas vidas durante o ano de 2020, (segundo foi dito), entre elas o meu querido amigo José Eduardo Reis Oliveira. 
E escrevo, segundo foi dito durante o ano de 2020, porque o José Eduardo, (para muitos o Jero), penso que se destacou toda a sua vida pelo que sei dele, embora só o tenha conhecido nestes últimos pouco mais de 10 anos, mas que sendo poucos nas nossas vidas de mais de 70, foram os suficientes para fazer nascer e crescer uma amizade forte, inabalável, sincera, confidente cheia de uma profunda admiração e respeito um pelo outro. 

Quando eu era novo, se alguém dissesse de alguém - esse é um “homem bom” - tudo estava dito sobre essa pessoa, porque esse “bom” incluía um sem número de virtudes e qualidades que distinguiam essa pessoa das demais. 

O José Eduardo era/é um “Homem Bom”! 

O José Eduardo podia ter sido advogado ou juiz, médico ou enfermeiro, (que foi na vida militar), professor ou aprendiz, varredor da rua ou professor catedrático, ou tantas e quaisquer outras profissões, que nunca deixaria de ser um “Homem Bom”. 

Apaixonado pela “sua” Alcobaça, a sua terra, (fazem falta hoje pessoas apaixonadas pelas suas terras para as servir sem delas se servirem, como o José Eduardo), um contador de histórias, um investigador da simplicidade do verdadeiro do dia a dia, um escritor de escrita “limpa”, um amigo como aqueles que o são, um ombro para quem dele precisasse, um sorriso para os tristes e desolados, um orgulhoso português sem outras peias, um confidente e um humilde “pedidor” de conselhos, um pai de família, um avô de netos, um homem de excepção. 

Passear com ele em Alcobaça, era descobrir a terra e as suas gentes, do mais importante ao mais simples, era nunca acabar de cumprimentos, de sorrisos, de abraços. 

Em qualquer canto de Alcobaça, com ele como guia, se faziam as coisas melhores do mundo, desde a pastelaria ao vinho e licor, se encontrava a memória e se viviam as histórias, se tornavam vivas as esquinas das ruas e as casas por onde passávamos. 

Estar com o José Eduardo era estar com a história sempre presente de Alcobaça, era um reviver da Guiné por onde passámos os dois, mas sem medos, nem recriminações, era um constante perguntar e um permanente responder. 

O José Eduardo era/é uma dádiva de Deus à sua família, a Alcobaça, aos seus amigos. 

Exagero? 
Eu sinceramente acho que não! 
Será a amizade que lhe tinha/tenho que me faz escrever assim? 
Não, acho que não, porque sinto em mim que o que escrevo é verdade, e não apenas um panegírico de um qualquer louvor, que até ofenderia a sua memória. 

É, para mim, um imenso orgulho ter sido e continuar a ser um dos seus bons amigos, ter aprendido com ele um pouco mais da virtude da paciência e da humildade e ter desbravado caminhos de Deus, nas perguntas e respostas que ambos suscitávamos quando vivíamos a fé no dia a dia. 

Estive hoje em Alcobaça, a convite da Helena do José Eduardo, (resisto a chamar-lhe viúva), com os seus filhos e netos e senti-me verdadeiramente com o José Eduardo, naqueles que o viveram e vivem bem mais do que eu. 

E, para mim, foi uma honra inigualável este convite que fica marcado no meu coração com o selo perene da verdadeira amizade. 

E tu, José Eduardo, lá no “assento etéreo” a que subiste, (como dizia o poeta), olha pelos teus, olha pelos amigos, olha pela tua terra e vive a felicidade eterna que tão bem mereceste, nos abraços, beijos e sorrisos que foste distribuindo ao longo da tua vida. 

Até já, José Eduardo! 

Marinha Grande, 20 de Agosto de 2021 
Joaquim Mexia Alves 

Na segunda foto aparecem a Eduarda, filha do José Eduardo, e os seus filhos Pedro e Mariana, que receberam a homenagem em nome da família.

segunda-feira, 23 de agosto de 2021

P1307: LENDAS DE MONTE REAL -1

                         LENDA DE SEGODIM

Vivia a Rainha Santa – diz a lenda – amargurada em seus Paços de Monte Real pelas frequentes ausências do Rei D. Diniz, seu esposo, distraído como andava em digressões amorosas.

Certamente inquieta e cansada de esperar, resolveu a Rainha ir com alguns pagens, munidos de tochas acesas, postar-se no caminho onde sabia que o Rei devia passar.

Quando este chegou cavalgando, ao deparar com o que via, apeou-se e, disse agastado, dirigindo-se à esposa: - Que fazeis aqui, Senhora Minha, com gente tanta?!...

Vim alumiar-vos o caminho, Senhor – respondeu a Rainha – pois cego vindes de amor...

Verdade ou lenda, o certo é que hoje existe o lugar de Segodim, que pertence à freguesia de Monte Real, de que dista cerca de um quilómetro.

(Olímpio Duarte Alves – No livro Monte Real no Passado e no Presente - 1955).

De “cego vindes”, o povo foi mudando a “palavra”, até Cegodim, hoje escrito Segodim.

Para aqueles que conhecem estas paragens, o lugar de Segodim, fica na estrada que liga Monte Real à Base Aérea nº5 – Monte Real, sensivelmente a meio caminho.

Joaquim Mexia Alves

segunda-feira, 16 de agosto de 2021

P1306: UM MODELO DE COMPARAÇÃO

                                  UM PIROPO...

Na Guiné, como “piloto da caça”, no dia-a-dia o meu relacionamento com o pessoal da linha da frente dos Fiat G-91 era algo reduzido, limitando-se ao período imediatamente antes do voo e após este, o que não se prestava a um conhecimento profundo do pessoal que nos apoiava. Talvez o facto de ser um oficial do quadro habituado a alguma reserva no relacionamento hierárquico tenha contribuído também para esse distanciamento.

Por outro lado, o ambiente na Esquadra dos AL-III era algo diferente, dada a coesão naturalmente desenvolvida entre a tripulação – pilotos, mecânicos de bordo, atiradores do heli-canhão e as enfermeiras paraquedistas, que complementavam a tripulação nas missões de evacuação.

Embora com as limitações decorrentes desse maior isolamento, os meus contactos no decorrer das missões foram proporcionando um maior conhecimento do pessoal da linha da frente, o que acabou por permitir uma maior aproximação aos mesmos fora das horas de serviço.

Lembro-me de, a convite de um deles, ter assistido a várias sessões de ensaio de uma “banda de garagem” constituída por mecânicos da FAP, e de em outras ocasiões ter participado em alguns convívios por eles organizados.

Como ponto forte deste tempo relembro a recepção que me foi feita à chegada à Base de Bissalanca, no regresso do hospital, comemorando o excelente trabalho desenvolvido por todos na minha recuperação na sequência do abate do meu avião.

Esse relacionamento mais informal que se foi desenvolvendo ao longo da minha comissão permitiu-me uma maior integração e aceitação no grupo, de tal modo que um dia recebi de um deles um piropo que terá constituído para o próprio a melhor apreciação que ele poderia fazer da minha pessoa: “O Senhor Capitão (*) é um tipo porreiro! Até parece miliciano!...”

Miguel Pessoa

(*) Embora em todas as minhas histórias da Guiné se fale sempre do Tenente Pessoa, a verdade é que os últimos oito meses da minha comissão os passei como Capitão, no período entre Novembro de 1973 e Agosto de 1974…

segunda-feira, 9 de agosto de 2021

P1305: POUCO CONHECIDO EM PORTUGAL, FAMOSO NOS U.S.A....

                   JOHN PHILIP SOUSA

Filho de emigrante português e de mãe alemã, nasceu em 1854 em Washington/DC e morreu em 1932 em Reading/Pensilvânia.

Dirigente musical Norte-Americano e compositor de inúmeras célebres marchas militares, entre outras em 1888 o Hino dos Fuzileiros Navais (Marine Corps) o "Semper Fidelis”, e mais tarde em 1897 a famosa marcha "The Stars and Stripes Forever".

Esta última foi nomeada em 1987 a Marcha Nacional e é sempre tocada em inúmeras cerimónias militares e civis (Não confundir esta com o Hino Nacional).

Quando jovem recebeu uma boa educação musical tendo sido violinista em Orquestras Clássicas e posteriormente Dirigente. Iniciou então a sua carreira como compositor.

Em 1868 entrou para os Fuzileiros Navais como aprendiz de Dirigente da respectiva banda. Aí criou uma enorme reputação tendo elevado ao máximo a capacidade musical do agrupamento.

Em 1892 criou a sua própria Orquestra tendo seleccionado cuidadosamente os músicos componentes, capazes de igual virtuosidade tanto em música clássica como em marchas militares.

Com esta orquestra veio a efectuar concertos na maioria dos Estados Norte-Americanos e na Europa (1900-1905). Finalmente, em 1910-191 deu uma volta mundial com a mesma orquestra.

Sousa compôs 136 marchas militares únicas na sua classe, tanto pelo ritmo como pelos efeitos instrumentais. Entre 1879 e 1915 escreveu 11 operetas, 11 valsas, 12 trabalhos musicais para dança, 70 canções, 11 suites, etc, etc.

Ficou conhecido nos Estados Unidos como o Rei das Bandas Musicais.

Em 1890 desenvolveu um tipo de trombone chamado "helicon" que, depois de fabricado segundo as suas instruções, passou a ser conhecido como o  "Sousaphone". É um instrumento presente em todas as bandas militares e civis Norte-Americanas e bem visível (e audível!) aquando dos desfiles das mesmas.

Quase ignorado em Portugal, o nosso Sousa é bem conhecido nos meios militares Americanos… e não só!

No entanto o John Philip Sousa é conhecido como... John Philip SUZA!

Mesmo assim, melhor que o quase nada que é o seu reconhecimento em Portugal.

José Belo

segunda-feira, 2 de agosto de 2021

P1304: EM MEMÓRIA DOS FILMES QUE COMECEI A VER A MEIO

Texto publicado em Junho de 2017 no blogue “Luís Graça & Camaradas da Guiné”, que fomos repescar com a devida vénia ao blogue e ao autor, Juvenal Amado.

LEMBRANDO O CINE TEATRO DE ALCOBAÇA

Gostei muito de cinema desde sempre e o Cine Teatro de Alcobaça foi ponto de encontro de gerações de Alcobacenses.

Em miúdo ia com a minha tia ver os filmes do Joselito e Marisol; mais tarde também me levou a ver filmes históricos, em especial sobre as guerras napoleónicas, género que deixou de ser tema de interesse para as produtoras cinematográficas, pois há muito tempo, tirando uma versão do "Guerra e Paz", deixei de ver em cartaz esse género de filmes.

Quando há tempos pela escrita do José Marques Vidal e Arturo Pérez-Reverte voltei a lembrar-me do tema, revi mentalmente a batalha de Austerlitz, onde Napoleão derrota os exércitos russos, austríacos e ingleses, bem como outras venturas e desventuras do corso, que resolveu criar um Mundo à sua vontade até se afogar no seu próprio orgulho e megalomania.


Mas também era comum juntar-me aos Mendes, ao Cafézinho, ao BiBi e outros miúdos; numa das portas laterais esperávamos que o porteiro, senhor Sílvio, nos desse uma borla e assim nos deixasse assistir aos filmes.

- ”Não façam barulho e espalhem-se, não os quero todos juntos” - dizia ele.

Depois do primeiro intervalo, lá íamos nós sem fazer barulho até ao 3.º balcão, razão essa, que tenho na memória os filmes que nunca vi o principio como o "Ben-Hur", o "Rei dos Reis",  o "Barrabás", "Spartacus", etc, etc. Esses ficaram para sempre amputados dos seus inícios pelas razões que acabei de apresentar.

Entretanto comecei a trabalhar, e com direito a semanada, pude assim comprar o bilhete e começar finalmente a ver todos os filmes desde o início. Estava na época dos filmes "cobóis" "esparguete" com o Clint Eastwood, (quem diria que ele se faria num dos maiores realizadores do nosso tempo?), o Bud Spencer e Terence Hill, etc, que gastavam mais balas na apresentação do que em todas as guerras do México. As pistolas de seis tiros disparavam sem cessar, nunca ficavam sem balas...

Também os filmes de karatê do Bruce Lee levavam legiões de admiradores, e era vê-los à saída do cinema, a gingarem-se e a imitar os tiques do actor. Simplesmente hilariante, quando ele era atacado por mais de vinte bandidos, que despachava num ápice. Ficava sempre para o fim um e esse, é que era sempre uma rolha dura de roer. Entre gritos, chapadas e pontapés de toda a forma e feitio, o nosso herói tinha mais trabalho com esse do que com os outros vinte…

Por causa desses filmes logo apareceram escolas de karatê nas diversas modalidades, o que deu azo a episódios caricatos como o do meu amigo “Bife”, que acabado de ter a sua primeira aula de Tae Kwon Do, se envolveu logo à pancada com outro junto ao campo de ténis.

Filmes completamente irracionais e sem ponta por onde se lhes pegar, mas a malta não sabendo mais o que fazer, ia ver as "coboiadas" de feios porcos e maus e ouvir o Pelé lá do 3.º Balcão, que em plenos pulmões tentava avisar o herói que os índios estavam emboscados ou que um bandido vinha à falsa fé para lhe fazer a folha.

As gargalhadas sucediam-se a cada nova exclamação do nosso bem conhecido angariador de peles de coelho e ferro velho. O velho Pelé também servia para as mães meterem medo aos filhos, que praticavam qualquer maldade, ou não queriam comer a sopa. A sua imagem andrajosa com um saco às costas, era assim aproveitada para o imaginário da garotada.

Também a Escola Técnica de Alcobaça, sob a batuta do professor Miranda, levava à cena as peças no Cine Teatro, que ensaiava para serem apresentadas nas suas festas anuais. Nunca me esqueci da peça "A Gaivota", de Anton Tchecov, e também quando o teatro de revista deixava o Parque Mayer e fazia digressões pela província.

Naquele tempo o Cine Teatro abarrotava de espectadores e, na maioria dos casos, só ficavam livres as cadeiras obrigatoriamente guardadas para os descendentes do fundador António de Oliva Monteiro.

Depois fui para a tropa e para a Guiné. Durante 3 anos não me deliciei com os filmes nem com a vivência ao redor dos mesmos.

Na Guiné, em Galomaro, fomos uma vez visitados pelos serviços de foto-cine do exército, se não estou em erro com o filme "Chaimite", na verdade um tema bem a propósito como é bom de ver. Foram exibidas duas sessões para dar oportunidade a quem estivesse de serviço de ver o filme no dia a seguir. Numas das sessões, calhou-me fazer reforço na porta de armas e tive o maior assédio de lavadeiras de que há memória, pois queriam que eu as deixasse entrar para ver o filme. Está claro que não podia deixá-las entrar sob pena de o Coronel me dar uma porrada de todo o tamanho, mas devo ter ficado com fama de ser um bom filho p… durante muito tempo.

Sei que havia salas de cinema em Bafatá e em Bissau, mas nunca lá fui ver nada. Se calhar porque só pernoitei uma vez em Bafatá, no seguimento da trágica morte do nosso camarada Teixeira, e em Bissau estive só de passagem e com pouco ou nenhum dinheiro.

Quando regressámos, deu-se a explosão com o fim da censura; as sessões sucediam-se para vermos os filmes até ali proibidos, ou revermos os que tinham sido amputados das cenas que a comissão da censura tinha resolvido cortar.

Seguiram-se as sessões de pornografia, que eram exibidas depois da meia-noite.
Depois o declínio foi-se agravando, e não foi só em Alcobaça. As salas começaram a ficar vazias por causa dos centros comerciais e das suas sessões continuas, da televisão, dos clubes de vídeo. Estas por sua vez foram à falência por casa da TV por cabo, onde podemos ver filmes a toda a hora sem se sair de casa, com a qualidade HD nos LED's de tamanho considerável com sistemas de som circundante.

O que virá a seguir não sei, talvez com máquinas de realidade virtual em que sejamos expectadores e actores ao mesmo tempo, com influência no guião do filme.

Ontem liguei a televisão, e estavam a exibir o filme "Cartas de Guerra". Já ia adiantado, mas mercê das novas tecnologias, voltei atrás para ver de principio. Gostei, apesar de algumas incongruências, digo eu, uma vez que a guerra que travámos na Guiné foi forçosamente diferente da de Angola pelo tipo, pelo espaço físico e também pelo antagonismo existente entre os três movimentos independentistas. O filme faz-me lembrar uma banda desenhada com grandes planos e muitas imagens falsamente paradas, em que o autor tenta transmitir ao espectador a dor, o isolamento, o desamor e a violência daqueles dias, usando um ambiente surreal. (A ver os "Vampiros" com textos de João Melo e desenhos de Juan Cavia, uma história de ficção passada na Guiné em 1972).

Fez-me reviver os nossos mortos, e as imagens a preto e branco, mais os gritos na escuridão, conferiram um efeito trágico e sufocante sobre as minhas próprias memórias. Desejável seria que este filme fosse ponto de partida para mais registos devidamente aconselhados, por homens que sabem com conta peso e medida aplicar com rigor as recordações daquele tempo.

Hoje o Cine Teatro de Alcobaça continua lindo. Cinema pouco, mas chegam-me notícias de teatro, teatro de marionetes, bailado e também musica de vários géneros. Os filmes é que parecem rarear naquele espaço mas isso é fruto dos tempos. *

Juvenal Amado

* O texto está um pouco datado, pois foi publicado em Junho de 2017. Mas, consultando o site do Cine Teatro (cineteatro.cm-alcobaca.pt), verificamos existir um programa de espectáculos interessantes a apresentar nos próximos tempos, parecendo que o Cine Teatro de Alcobaça mantém a sua vitalidade.