quinta-feira, 16 de janeiro de 2014

P426: COM UNS ANITOS... MAS ACTUAL



OS MEUS FANTASMAS



Tenho as noites povoadas
de estranhos fantasmas
que se arremetem contra mim
e não me deixam descansar.

Vêm de longe
estes fantasmas,
de longe no tempo,
e no espaço até,
vêm de África,
vêm de terras da Guiné.


Por vezes atormentam-me,
fazem-me sofrer,
fazem-me chorar.

Por outras vezes contudo,
fazem-me rir,
obrigam-me a viver,
povoam o meu sonhar.

Há noites em que acordo,
encharcado em suor,
ou serão lágrimas de dor,
que molham o meu travesseiro?

Mas outras noites há também,
em que adormeço pacifico,
como que envolvido na paz,
embalado no amor.

Durante o dia aquietam-se,
não saem a terreiro,
passeiam-se comigo,
é certo,
mas não se fazem notados,
nem pela forma,
nem pelo cheiro,
(não há nenhum que se afoite),
mantêm-se adormecidos,
como que a ganharem forças,
para me fazerem companhia…
à noite!



É o cheiro da terra quente,
o pôr-do-sol encarnado,
o macaréu apressado,
que abafa o grito da gente,
que se tinge de coragem
à falta de outro fado.




Trato-os por tu,
são meus,
embora eu muito suspeite,
que também atormentam outros,
ao longo de cada noite,
mal dormidas,
mal sonhadas,
misturadas de suores,
e de lágrimas choradas,
compondo um quadro pintado
das mais violentas cores,
um quadro longo, longo,
que nunca está acabado.


Deito-me com eles,
os meus fantasmas,
já fazem parte de mim,
do meu dormir,
do meu sonhar,
são como um despertador
que não me deixa dormir,
que me obrigam a lembrar,
o que foi o meu viver,
por terras dessa Guiné.



Dizem-me ao ouvido,
baixinho,
que não querem atormentar,
nem sequer o meu existir,
nem tão pouco o meu viver,
mas apenas querem gritar,
bem alto,
para que todos ouçam,
o que os outros que por aqui andam,
fazem questão de esquecer.

                             Joaquim Mexia Alves
                             27.12.91

3 comentários:

Manel Kambuta dos Dembos disse...

Camarigo Joaquim, obrigado por este teu puro e verdadeiro testemunho, desculpa-me por este meu sensível desabafo, mais uma vez fui apanhado numa emboscada, fiquei com o meu rosto molhado com muitas gotas, penso que sejam de lágrimas misturadas com suor,pois, todos nós COMBATENTES DO ULTRAMAR, pertencemos a uma geração sofrida, que nos tempos que correm muitos querem e teimam em chamar mentira ás nossas verdades, mas, o que todos nós sabemos é que, essas verdades nunca deixaram de ser ditas, contadas e gritadas em alto e bom som com todas as forças vindas do nosso peito «coração» e nossos pulmões, enquanto existir um COMBATENTE DO ULTRAMAR, lembrem-se esses que teimam em dizer que as nossas verdades são mentiras, que os COMBATENTES DO ULTRAMAR, sempre foram, são e serão enquanto vivos forem, MUITO UNIDOS, MUITO IRMÃOS, POIS, SÓ ELES SE ENTENDEM MESMO SÓ NO OLHAR, JOAQUIM,MEU IRMÃO DE GUERRA,eu Manel Kambuta dos Dembos Norte de Angola, agradeço que continua a escrever e a deitar estas verdades cá para fora, verdades que nos continuam a corroer o nosso sempre forte esqueleto, mas, com as nossas forças e amizades criadas nos palcos de guerra, se vamos ajudando e socorrendo uns aos outros, eu que o diga, mais uma vez te peço meu IRMÃO, continua, estas palavras escritas são ajudas que a todos nós, gostamos de ler e recordar, e, ficamos aliviados. UM FORTE ABRAÇO DO MANEL KAMBUTA DOS DEMBOS PARA TODOS OS CAMARIGOS, E, «SEMPRE PARA A FRENTE QUE ATRÁS VEM JENTE».

Anónimo disse...

Os Fantasmas de todos nós...

Muito bonito e verdadeiro.

Um abraço Camarigo Joaquim

Vasco

Anónimo disse...

Um testemunho com "marca registada".
Obrigado Joaquim Mexia Alves.
Abraço continuado.
JERO