MASCOTES E ANIMAIS DE ESTIMAÇÃO E/OU COMPANHIA
OS GATOS…
Helder Valério Sousa |
Dado que esta recordação
já foi anteriormente publicada no Blogue da “Tabanca Grande”, fará 10 anos,
pareceu-me oportuno fazer uma “revisão” para a encurtar e, se possível,
melhorar.
Como de costume, quando
escrevo algo sobre os tempos vividos na Guiné, é motivado por vários elementos
que vão aparecendo e que depois de os remoer, um pouco, acabam por me fazer
lembrar das situações ou acontecimentos. Veio isto ao caso por, ao longo do
tempo, terem sido publicados “posts” em que se falava de aves, pássaros vários,
morcegos, “ui-uis” e quejandos e da quantidade e variedade de comentários que
suscitou.
A propósito deles
ficámos a saber de “pardais amestrados”, de convívios com morcegos, da
admiração pelos jagudis (quase sempre confundidos com perus pelos periquitos…).
Também já se tinham referido a cães que, por todas as tabancas, quartéis e
aquartelamentos, eram muitas vezes a grande companhia para as solidões.
Até se fez referência a
uma tresloucada acção de ‘matança’ de cães que, algures no mato (longe de
Bissau, portanto) incomodavam quem não deviam… Igualmente sabemos de periquitos
e outras aves que ajudavam a passar o tempo das ‘horas mortas’. Aqui e ali são
também conhecidas as proximidades com aqueles animais que, na generalidade,
referimos como macacos. E por aí fora.
Não me apercebi de
coisas estranhas, mas possíveis, como ter como mascote ou companhia crocodilos,
osgas, iguanas, grilos ou cobras (de várias espécies) mas não posso jurar que
não os houvesse… Agora, o que mais me intriga, é a falta de referências aos
gatos.
É que esses animais,
sempre com o seu estilo particular, lá como cá e noutras partes por onde
existem, estiveram presentes durante as nossas ‘comissões de serviço’.
Eu sei que falar de gatos pode parecer um pouco “abichanado”
mas mesmo assim, se me permitirem, vou referir-me a eles.
E, para começar,
apresento um poema que o nosso camarada Marques Lopes fez publicar na “Tabanca
de Matosinhos”, no início de Agosto passado (2009), em homenagem a um seu amigo
entretanto falecido fazia 6 meses, sendo esse o autor do poema e de seu nome
Fernando Vale.
O GATO
O gato é um felino
Aristocrata
Sempre usou laço
Nunca quis gravata
O gato é um felino
Snob
De trato fino
Até vaidoso
O seu andar?
Suave, silencioso
Independente
Misterioso
Nunca submisso
Mostra unhas
Também os dentes
Se em duelo
Tanto for preciso
Usa bigode
Destemido, soberbo
Sempre snobe
Não conhece o medo
O seu porte
A muitos humanos
Não agrada
Mas este felino
É um nobre
Capaz de ronronar
Ao exigir uma carícia
É snobe
Mantém sempre
A cabeça levantada
É nobre
Até mesmo quando caga
O gato é um felino
Aristocrata
Sempre usou laço
Nunca quis gravata
(Fernando Vale, 28.02.2008)
Ora acontece então que
durante a minha permanência no “Centro de Escuta” os gatos foram a minha
companhia, principalmente durante as longas noites de serviço e disso não
posso, nem quero, esquecer-me.
Disse “durante a noite”
porque tanto a “Morcona” como o “Kiki” só nesse período se deixavam ver. Não
sei porquê, nunca me disseram nem consegui descobrir. Durante o dia
desapareciam completamente das vistas e só depois do sol-posto apareciam. Houve
também um outro, o “Caçador”, que era completamente diferente.
Eu e o "Caçador" |
Esse dava-se a ver
durante o dia e deixava-se agarrar. Chamei-lhe assim porque era um caçador
nato, apanhava tudo o que podia, ratos, sapos, lagartos ‘paga-dez’, até cobras
e víboras e depois muito vaidoso carregava as presas e vinha oferecer-me, numa
espécie de deferência.
Tudo começou pela
“Morcona” que era a gata-mãe dos outros dois, em ninhadas diferentes. Quando
cheguei á “Escuta” essa gata estava no forro da casa, tendo entrado para lá por
essa ocasião por um buraquito, mas pelo qual já não podia sair.
Pensámos em deixá-la por
lá, mas sempre havia o perigo de alguma incomodidade pelo cheiro e não só, e
eu, aos poucos, fui tentando cativar a sua confiança, através da comida que lhe
levava pelo alçapão de acesso existente na “Escuta”, o que acabei por
conseguir. Traindo a sua confiança conquistada com tanto trabalho, consegui
agarrá-la e fazê-la passar por esse alçapão, recuperando igualmente três
pequenos gatitos.
A pose serena da "Morcona" |
Inicialmente ficou
‘louca da vida’ mas acabou por não rejeitar as crias, as quais foram
acondicionadas no que seria a chaminé da casa onde vivia que era contígua ao
“Centro de Escuta”, de modo bem disfarçado e que lhe deu bastante privacidade.
Esta ninhada esteve na
origem de um episódio bem caricato passado com o meu camarada Nélson Batalha (entretanto
já falecido e que na época compartilhava o quarto comigo), e que foi o
seguinte:
Por esses tempos era
hábito, aos sábados, o Sr. Comandante do que viria a ser o Agrupamento de
Transmissões, Tenente-Coronel Ramos, passar revista às instalações,
incluindo-se aqui os alojamentos dos Sargentos, que muito se incomodavam com
esse aparente atestado de menoridade (o Sr. Comandante ia ver se os quartos
estavam bem arrumados e limpos…).
Nesse sábado o Nélson
saiu de serviço às 7 da manhã e foi dormir para o quarto, preocupado com a
existência da ninhada de gatos e com o que sairia da ‘vistoria’ rotineira.
Como fui eu que o
substitui no serviço, estava na “Escuta” quando o Sr. Comandante e comitiva
passaram por lá e procurando-me antecipar à continuação da visita à casa ao
lado, onde era o nosso quarto e também a improvisada ‘maternidade’, fui lá ver
se estava tudo bem camuflado (e estava!) e quis avisar o Nélson da iminente
presença das chefias, só que a sua preocupação fez com que ele, estremunhado,
gritasse bem alto:
- “Eh pá, tira-me daí
esses cabrões!” - (é claro que ele se referia aos gatos, que achava serem
da minha responsabilidade…)
Só que não houve tempo
de intervalo suficiente entre o meu aviso e a presença dos ‘superiores’ que,
como devem calcular, não tendo conhecimento da existência dos gatos (nem os
viram, tal a camuflagem), ‘não tiveram dúvidas’ a quem aquele impropério se
dirigia!
Como o Nélson estava nas
‘boas graças’ do Sr. Comandante por ter sido ferido e evacuado de Catió, em
resultado de ferimentos ocorridos num ataque àquele aquartelamento e era um
‘bom cartaz’ demonstrando assim que o pessoal do STM também corria riscos, a
coisa passou ‘à pala’ de o Nélson ainda estar um bocado ‘apanhado’ e com
sobressaltos resultantes dos ferimentos…
O "Caçador", sempre atento |
Pelas fotos que junto podem ver o porte altivo da “Morcona” e as expressões argutas do “Caçador”. Do
“Kiki” não encontrei qualquer foto.
Peço desculpa por vos
tomar tempo com estas coisas menores mas acho que também devem fazer parte do
‘levantamento’ que fazemos das nossas memórias, e a questão dos animais de
companhia ou mascotes não são despiciendas, pois muitas vezes serviram para nos
fazer sentir que ainda éramos humanos.
No
meu caso, e tratando-se de gatos, não posso dizer que eram as minhas mascotes
ou animais de companhia, já que foi muito mais eles a escolherem-me do que eu a
eles. Volto a utilizar (com a devida vénia) as palavras do Marques Lopes que
cita Manuel António Pina em artigo do “Jornal de Notícias”, de que “nunca viu
um gato a fazer habilidades num circo...”, para ilustrar bem o que se entende
da ‘personalidade’ felina.
Hélder Sousa (Fur.
Mil Trms TSF)
6 comentários:
Muito bem!
Viva o Helder que gosta de gatos (como eu) neste tempo em que só se fala de cães.
Pois, quando era garoto havia gatos lá em casa e por todo o lado. MAS, MAS... na Guiné, nos vários lugares das nossas andanças várias por aquelas terras, NUNCA vi gatos. Talvez tivessem sido aproveitados pelos vagomestres para mandarem fazer "coelho à caçador". Talvez.
Abraços, Helder!
Alberto Branquinho
O Hélder Valério trás aqui um assunto deveras interessante para mim, pois desde que lembro sempre houveram gatos em todos os momentos da minha vida, excluindo o tempo na Guiné. Se bem me recordo não tenho ideia de me ter cruzado com doméstico felino pelos destacamentos por por onde andei. Talvez seja só uma falha da minha memória mas na verdade. não tenho ideia nenhuma disso.
Eu mais a minha mulher, dividimos o apartamento com duas gatas e é umas preocupações de quando saio para qualquer lado, ter que arranjar quem delas cuide quanto à alimentação bem como limpeza uma vez, que a fama independência de gozam os bichanos, não chega a esse patamar
Mas toda esta conversa faz-me lembrar o Agostinho da Silva, que numa entrevista onde pelo o menos uma dúzia de gatos assentavam arraiais no escritório, ao perguntarem-lhe se eles não o incomodavam no seu trabalho, ele respondeu que a única preocupação, que tinha com eles era de quem lhes ia dar comer quando morresse.
Agostinho da Silva que, numa altura da sua vida, se deslocava de Lisboa a Sesimbra com o único objetivo de alimentar gatos, com quase 88 anos de idade levantava-se às cinco da madrugada e dedicava aos gatos as duas primeiras horas do dia, limpando as areias, lavando a louça e dando-lhes alimento e mino e passeando no terraço.
Quase como eu :-).... É o meu serviço às sete da manhã sobre pena de se irem aliviar na carpete.
Um abraço
Gostei Hélder. Na minha companhia da Guiné não havia "gatos...Só gatas.
Eu tive um macaquinho que tratava por "Inho". Havia também aves de diversas espécies e cores e não me lembra de mais nada.
Como o tempo passa?
Na vida civil sempre gostei muito de gatos. Em miúdo tive um que se chamava "Tico" que, para minha tristeza, morreu atropelado.Nunca mais o esqueci.
Recordo-o com a tua quadra:-
"O gato é um felino
Aristocrata
Sempre usou laço
Nunca quis gravata."
Abraço de Alcobaça e venham mais"memórias".
JERO
Caros amigos
Pois também não me recordo de ter visto gatos no interior, nomeadamente em Piche, o que não quer dizer que não houvesse. Simplesmente, não tenho memória disso.
Mas há uma coisa que se deve "corrigir". O texto foi originalmente escrito (agora só teve uns ajustes) em 2009 e aí eu escrevi que, tal como António Pina "nunca tinha visto um gato a fazer habilidades num circo". Mas agora é preciso que se diga que já vi, não um mas uns quantos (salvo erro, se a memória não falha, uns 5 ou 6), a "actuarem" e bem.num espectáculo, embora tenha visto essa reprodução na internet.
Para os "amigos dos gatos" aqui deixo a minha solidariedade. Em pequenito, aí com 3 ou 4 anos, tive um gato, o "Zequinha" que tinha uma paciência e condescendência inesgotáveis para todas as diabruras que lhe fazia. Agora. em tempos mais recentes, tivemos cá em casa o "Ramsés", durante 19 anos, e a sua morte no domingo de carnaval foi triste, mas não interessa agora para nada. Chato, chato, era quando se "lembrava" de passear por cima do teclado do computador....
Quanto a recordações... haverá mais!
Abraços
Hélder Sousa
Houve um amigo que questionou se não teria sido o gato a escrever alguns comentários.... pois não posso garantir que não!
Hélder Sousa
Achei graça à estorinha do amigo Hélder Valério.
Também não me recordo de ver gatos na Guiné.
As mascotes, ou eram periquitos ou macaquinhos.
Na nossa casa tínhamos periquitos que chamávamos de papagaios, mas um oficial chegou a ter dois jacarés bebés.
Tive não há muitos anos, um gato tipo “bosque da Noruega “, que um dia ao fugir dele, sofri um acidente e fiz uma fractura grave, no membro superior direito. Fiquei vacinada e acabei com mascotes ou animais de estimação.
Penso que com sorte, serão boas companhias e aceito perfeitamente quem os tenha.
Um abraço para o amigo Hélder e Miguel por nos facultarem estes testemunhos, de acontecimentos que fazem parte das nossas vivências.
M Arminda
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