A MINHA LAVADEIRA
A toalha modelo FAP |
Há poucos dias estava eu
descontraidamente a limpar as mãos a uma toalha que uso esporadicamente quando
resolvi prestar um pouco mais de atenção ao material que estava a usar, e isso
trouxe-me recordações antigas. Embora de qualidade modesta, aquela toalha tem
já uma história para contar, pois faz parte da casa desde o tempo da minha
estadia na Guiné nos idos anos de ’72 a ’74.
É uma simples toalha modelo FAP
que comprei juntamente com outras para uso durante a minha comissão, pensando
eu que no fim as deixaria por lá, por não serem mais necessárias. O facto é que,
dadas as boas condições em que se encontrava, optei por trazer a toalha comigo.
Penso que nem foi a única; mas uma característica interessante desta toalha é
que, apesar das muitas lavagens por que passou, mantém num dos seus cantos,
cosido com linha azul, um círculo que identificava toda a roupa que eu enviava
à minha lavadeira.
Pormenor do círculo azul cosido na toalha |
É um bocado forçado falar na “minha
lavadeira”… É que na realidade nunca lhe pus os olhos em cima… nem as mãos,
como tenho visto em algumas fotografias da época… Penso que na Base Aérea 12
(ou pelo menos no meu caso pessoal) as lavadeiras não andavam por lá – e era um
rapaz africano o agente/intermediário que estabelecia os contactos comigo,
recebendo e entregando a roupa e acertando as contas ao fim do mês.
Devo dizer que não tenho razões
de queixa do serviço prestado. Não me lembro de se terem extraviado peças de
roupa nem de ter havido uma degradação visível do material por excesso de
energia na lavagem... E ao longo de todo o tempo este acordo comercial
funcionou na perfeição, a contento de todos.
Trabalho das lavadeiras na Fonte dos Amores, em Aldeia Formosa |
Bom, na verdade houve algo que nunca
consegui meter na cabeça daquele rapaz. É que, quando era necessário remendar
algum estrago na roupa, conviria utilizar uma linha de cor consentânea com a
peça a recuperar… Não seria o caso da roupa civil, que não sofreu grandes
danos; mas o mesmo já não se passava com os fatos de voo. Para além do clima exageradamente
quente que provocava grande transpiração na execução das missões (engana-se
quem pensa que trabalhar sentado não é exigente…), a qualidade do material,
muito fibroso, associado à transpiração, provocava queimaduras, nomeadamente
nas virilhas. E em determinada altura surgiram alguns fatos de voo de muito má
qualidade que, depois de usados, se podiam pôr a secar de pé, que ficavam “tesos
que nem um carapau”… Por isso os denominávamos de bacalhau…
Ora, os pequenos rasgões que iam
surgindo nesses fatos de voo iam sendo recuperados pela lavadeira com a linha
que tivesse mais à mão. E era possível ver pequenos remendos nesse equipamento
com as cores mais variadas – verde, vermelho, preto, branco – contrastando com
a cor azul escura dos fatos de voo. A esta distância lamento nunca me ter
lembrado de comprar um carrinho de linhas de cor azul e oferecê-lo à minha
lavadeira para proceder aos ditos arranjos…
Nos dias de hoje utilizar um fato
de voo naquelas condições seria considerado uma heresia!
Miguel Pessoa
2 comentários:
Miguel
A moda de cozer as camisas da tropa com a linha que estava mais à mão era endêmica por toda a Guiné.
Assim uma camisa verde com um botão cozido com linha vermelha era o máximo de estilo.
Também dei linhas e dei dinheiro para a minha Mariama me cozer os botões com uma cor a condizer. Mas de nada me valeu, pois a linha que ela usava era tirada do pano que trazia enrolado à cintura e assim além da variedade de cores era podre.
Foi então que tive a ideia luminosa de pedir ao estofador um bocado da linha, que ele usava para cozer por exemplo o saco que orientava de que lado vinha o de vento e assim foi. Passei a cozer eu os botões e o meu orgulho na minha esperteza duro pouco pois eles já não caiam mas passei a andar com eles partidos.
Está clara que nunca aceitou a culpa
Olha está quase tanto calor como lá
Um abraço
A mim não me aconteceu nada disso...
Também era o que mais faltava, a uma mulher!... Porém o camuflado lavado com uma ostra, pelo Afonso, ( o serviçal ) ao nosso serviço, ficou bem marcado...
A restante roupa pessoal, era eu que a lavava. Sempre ficava melhor e mais conservada.
Um abraço
M Arminda
Enviar um comentário