sábado, 20 de maio de 2017

P912: EM FIM DE COMISSÃO

INÍCIO DO REGRESSO A CASA

JERO
Em 17 de Abril de 1966 foi rendido o nosso 1º Pelotão, de Guidage, pelo 3º. Grupo da Companhia de Artilharia do 731. Em Binta já há uns dias que decorria a transmissão da carga da «675» para a Companhia que nos iria render na «quadrícula». Torrava-se no aquartelamento. O calor era infer­nal, mesmo para os veteranos.

O nosso Comandante de Companhia, Tenente Pedro Cruz, bem avisava o Alferes «maçarico» da C.Caç. 1550 para se pôr a pau com o calor. Transpirava no armazém coberto de zinco e, de tronco nu, ia recebendo o material do nosso cabo-quar­teleiro. No dia seguinte estava mesmo «cozido»... Não acres­centamos «mal pago» porque Alferes... para 1º emprego... não era mau de todo!

A malta ia arrumando os seus "pertences" em caixas, caixinhas e caixotes e, finalmente, chegou o dia da partida. A despedida foi emocionante. A "aldeia" em peso veio despedir-se da «675».


Lágrimas e mais lágrimas selaram uma vida em co­mum. Com muitos sacrifícios mas também com momentos inesquecíveis que a todos nos marcaria pela vida fora. Binta ficava para trás... Aqueles momentos da despedida seriam para mais tarde recordar.

A estrada para Farim era bem conhecida de todos. Quan­tas vezes percorremos aquele itinerário! Chegámos a Farim e ao Batalhão sem problemas de maior. Chegámos sem problemas porque os «ditos» (os proble­mas) estavam lá à nossa espera.

As ordens eram para entregar as armas e seguir numa coluna para Bissau, com passagem pelo Óio, com «passaporte de turista». Que «presente» envenenado! Desarmados, apreciando a paisagem e tirando fotogra­fias !!!

É verdade que seríamos escoltados por um pelotão mas passar pelo Óio «desarmado» era coisa que nunca nos tinha passado pela cabeça. A «nossa» relação com o Batalhão 733 nunca tinha sido das melhores e estava a acabar mal.

Viveram-se momentos difíceis (para não empregar pala­vras mais vernáculas) mas os nossos oficiais lá conseguiram levar a sua avante. Seguimos para Bissau com as nossas armas. Foi uma viagem de nervos, muitos nervos. Chegámos ao nosso destino já de noite. Estoirados. Com os nervos em franja. O nível de simpatias pelo Batalhão 733 não era, propria­mente, elevado.

A malta encostou «às boxes» e os nossos oficiais foram tentar entregar o nosso armamento. Mas havia «baile de gala» no Quartel da Amura e... ninguém nos esperava...


Para escândalo público o nosso Tenente Cruz apareceu de camuflado e de cara enfarruscada no baile e ... lá «conseguiu levar a carta a Garcia» ! Um amável Tenente-Coronel, de impecável farda branca, passou a noite «por conta» da “675” e conseguiu-se entregar o armamento até às tantas da manhã.

Uma ideia esquisita que retemos desse dia memorável (em que para «quase» todos nós acabou a guerra) foi a de que nin­guém em Bissau nos esperava. Ninguém contava com a chegada da Companhia de Caçadores 675!

E... finalmente o embarque no «UÍGE» e o início do regresso a casa. Já lá vão mais de 50 anos. Como o tempo passa !

José Eduardo Oliveira
JERO

2 comentários:

Anónimo disse...

Se o tempo passa ... amigo Jero... Também digo o mesmo.
Como podem estar tão presentes nas nossas memórias acontecimentos que nos marcaram!..
História interessante e com final feliz, dada as circunstâncias do regresso.
Lá estragaram o convívio do oficial que forçadamente os teve que receber. Contrastes da guerra...Uns a combater, outros a confraternizar...
Um abraço.
M Arminda

Anónimo disse...

Grato pelo seu comentário, querida amiga Maria Arminda. Par quem não andou "por lá" será uma história difícil de acreditar...Mas aconteceu mesmo. Uns a combater...outros a bailar.Ironias da vida. Abraço GRANDE de Alcobaça, JERO