domingo, 30 de abril de 2017

P906: AGORA NUM EXPOSITOR...

AVENTURAS DE UM CAPACETE…
E NÃO SÓ…

Miguel Pessoa
Há tempos foi publicado neste blogue um Poste (P866) da autoria do meu camarada Alberto Roxo da Cruz, em que ele relatava as peripécias que envolveram a sua ejecção e recuperação nas matas da Guiné. Dessa história – que naturalmente conhecia, pois eu também estava lá… - fixei uma frase ali escrita:

“Aí, apercebi-me que tinha perdido o capacete, que estava com o francalete bem justo, assim como a máscara e a viseira colocadas. Quem quiser, que experimente retirar o capacete da cabeça, nestas circunstâncias. Nós tentámos essa experiência e ninguém conseguiu!”

A cena da perda do seu capacete na ejecção, essa desconhecia-a. Mas é em tudo igual ao que me tinha acontecido meses antes no Sul da Guiné, quando também tive que me apear dum Fiat G-91 em andamento… No meu caso não dá para relatar a minha descida em paraquedas pois não me lembro de nada entre o disparo da cadeira de ejecção e a recuperação da consciência uns minutos (?) depois da queda.

Esses pormenores já os relatei anteriormente no blogue "Luís Graça & Camaradas da Guiné" (podem ver aqui) .

Sobre o capacete, posso assegurar que também eu tinha a máscara de oxigénio colocada, o francalete devidamente ajustado e a viseira em baixo. Mesmo assim, o facto é que o capacete se foi embora durante a ejecção, o que mostra a brutalidade desta medida de emergência…

O que não contei então é que, mais tarde, em conversas tidas com o Gen. Paraquedista Norberto Bernardes (meu camarada e amigo desde os tempos da Academia Militar em 1965) me foram relatadas as peripécias da recuperação desse meu capacete, encontrado no mato pelo grupo que ele comandava (então como Capitão), inclusive com recurso a um ramo para ver se o IN o teria armadilhado…

Bom, como quem procura tem prioridade, no fim desse dia o meu amigo Bernardes estava na posse do meu capacete… e do meu paraquedas, os dois em razoável estado de conservação.

Magnânimo, o Norberto Bernardes propôs-me decidir qual a peça que eu gostaria de recuperar, ficando ele com a outra. Optei por ficar com o paraquedas, que achava ser uma boa recordação; afinal, iria ter um capacete novo quando voltasse a voar. E assim se fez: Eu guardei o paraquedas e o Norberto Bernardes levou o capacete para a sua casa.

Passados uns bons anos, parece que tivemos ambos um rebate de consciência – Afinal, lá em casa as peças não tinham grande préstimo, seria mais interessante se estivessem expostas num local em que pudessem ser apreciadas por outras pessoas.

Foi assim que em determinada altura o Norberto Bernardes me informou que tinha oferecido o meu capacete para ser exposto no Museu da Base Escola de Tropas Paraquedistas, em Tancos.

Achei a ideia interessante e resolvi oferecer o meu paraquedas ao Museu do Ar, da Força Aérea, oferta essa que acabou por não se concretizar por “falta de espaço para exposição do material” (palavras do responsável, que me escuso de comentar…).

Desde há muitos anos, principalmente desde a data da minha recuperação, os Paraquedistas têm sido uma família para mim, com quem gosto de me dar e que sempre me recebem bem. 

Foi por isso que em 2006 naturalmente resolvi oferecer o meu paraquedas ao Museu da Base Escola de Tropas Paraquedistas, onde hoje repousa na companhia do meu capacete, após uma longa separação de 33 anos, iniciada no longínquo ano de 1973…

Com um abraço especial ao Norberto Bernardes, um camarada por quem tenho grande amizade e consideração, lembrando também com saudade outro camarada que foi essencial na minha recuperação, o Cap. João Cordeiro, falecido num trágico acidente num salto de paraquedas, poucos meses mais tarde.


Miguel Pessoa



7 comentários:

Anónimo disse...

A propósito de capacete,pergunto-me por o ter esquecido com o passar dos anos,a quem pertenceu o capacete que tive entre mäos em Aldeia Formosa (e fotografei),creio que em fins de 1968,de piloto abatido na área de Gandembel?

Um abraco do José Belo

Tabanca do Centro disse...

O piloto abatido era o então TCor. Costa Gomes, recentemente falecido. A história é contada aqui,(Blogue "Luís Graça & Camaradas da Guiné":

https://blogueforanadaevaotres.blogspot.pt/2016/09/guine-6374-p16494-fap-97-pedacos-das.html

Abraço.
Miguel Pessoa

Juvenal Amado disse...

Miguel a violência da injecção do aparelho era caso a ter em conta como acabei de constatar pelo teu relato. Não sabia.

No caso dos aviões mais modernos há melhorias ou o caso passa-se mais ao menos da mesma forma?

Um abraço

Hélder Valério disse...

Olá Miguel

De facto não fazia ideia das forças envolvidas nesses actos de ejecção.

Por outro lado também não deixa de ser 'comovente' a falta de espaço...

Ainda bem que as peças puderam ficar novamente lado a lado.

Abraço
Hélder Sousa

Carlos Pinheiro disse...

Mais uma vez se prova que há muita história por contar. É pena que muita fique mesmo por contar. E quanto mais tarde pior. Um abraço.
Carlos Pinheiro

Miguel disse...

A cadeira Martin-Baker que equipava o Fiat G-91 exigia mínimos de 0' e 90 nós de velocidade para garantir condições de sobrevivência e "disparava" o infeliz com uma aceleração instantânea de 18 G's (18 vezes a aceleração da gravidade). Mais tarde surgiram sistemas de aceleração progressiva que agrediam menos o piloto. Mas naquele tempo era comum surgirem compressões da coluna que levavam o piloto a perder 2 cms de altura (como foi o meu caso). E ainda não recuperei...
Miguel Pessoa

Anónimo disse...

Gostei de ler.
A história do capacete e do pára-quedas,comparo-a com a de alguns casais que se separaram por um acidente de percurso, mas um dia a vida, voltou a juntá-los e aí ficaram toda a vida juntos para sempre,até que amorte os separasse.
Felizmente que os intervenientes desta história se reencontraram depois de longos anos separados e vivem juntos, no local onde são estimados.
M Arminda