VERSOS À BISSALANCA
A Base de Bissalanca era na Guiné a nossa segunda casa.
Na
época do Natal, mais propriamente, na passagem do ano de 1969 para 70, no
Hospital da Terra-Chã- Ilha Terceira Açores, o grupo de enfermeiras que aí se
encontrava, a Júlia, Rosa Mota, Delfina e eu, estávamos com um amoque - uma
profunda tristeza como costumávamos dizer - por ali estarmos colocadas, rodeadas
pelo mar por todos os lados.
Dias antes tínhamos feito um lindo presépio e
colaborado ativamente numa festa de Natal para os doentes internados. Chegado o
dia da passagem de ano, resolvemos que tínhamos
que nos animar. As saudades que sentíamos pela ausência dos nossos familiares e
amigos eram grandes, principalmente nessa data festiva. Resolvemos que o passaríamos
todas juntas e não deixaríamos só a colega que estava de serviço noturno. Contudo
estávamos tristes e um pouco de rastos. Lembrámo-nos um pouco de tudo, mas
principalmente de outras colegas que naquele momento estariam em piores
condições. Foi desse modo, que a nossa conversa se animou e o nosso pensamento
voou até à Guiné.
Como
eu dizia que sabia fazer versos de “rima de pé quebrado”, resolvi fazer para
cada uma uns versos que estivessem de acordo com o seu modo de ser, adaptando
as músicas de canções da época. Foi assim que Bissalanca também ficou
contemplada.
Bissalanca
acompanhou-me por toda a vida e acabei por a relembrar com os tais versos, (rima
de pé quebrado). O pessoal ensaiou e cantou os vários versos feitos após o
jantar, acabando por os gravar. Abrimos uma garrafa de espumante e, com uns
bolos que já tínhamos preparado, entrámos pela noite e saudámos o Novo Ano
fazendo a sua passagem à nossa maneira. Deste modo conseguimos amenizar o
ambiente e esquecer um pouco as saudades.
Nos
anos 1963/64 comandava a Zona Aérea o Ten. Coronel Durval e o 2º comandante
Cara de Anjo. Estava previsto ser feita uma piscina no terreno que se situava
atrás da capela, mas essa nunca chegou a existir e o espaço servia para o
pessoal fazer encontros de futebol, para descontrair e melhorar a sua condição
física.
Então,
aqui ficam os versos surgidos nesse serão:
VERSOS
À BISSALANCA
I
Oh!
Bissalanca terra de perdição
Não sei dizer, ai não, ai não
Porque te trago dentro do coração
Se pelas seringas ou pelo avião
II
Terra muito variada
Mandingas, Fulas Papeis
Mas nós não nos esquecemos
Dos Joões, Zés e Maneis.
III
Avenidas lá não há
Cinemas, não os há também!..
E a piscina em construção
Já não interessa a ninguém
IV
Há um avião no ar!..
Mas meu Deus que confusão
Com a TAP a aterrar
No dia do São Avião
V
Querem todos lá chegar
Vamos nós e os demais
Para ver passar as meninas
E recolher os jornais
VI
Toca o telefone, ou o alarme
Minha alferes não se demore
Se não é para a pista, é para o ar
Deixe o prato e traga a fome
VII
Os roncos vão levantar
E os tubarões, também
Os turras estão a atirar
E não respeitam ninguém.
VIII
Gosse gosse, toca a andar
Depressa com o trabalhinho
Minha alferes não se demore
Senão, lá vem um tirinho!..
IX
Que o turra pode espreitar
Na chegada ou na largada
Cravar a marca da casa
Com a célebre morteirada!..
Estribilho
Oh! Bissalanca terra de perdição…
Nota: A música era de uma canção do João Maria Tudela.
Mª Arminda
Santos
Enf.ª Paraquedista
3 comentários:
Espectacular. Muitos parabéns à poetisa e à sua inspiração. Beijinho.
Que “coisa” tão linda Maria Arminda! Parabéns! Um beijo amigo
Minha estimada amiga Arminda
Peço desculpa por só agora comentar mas não podia deixar de o fazer.
Os versos, de pé-quebrado ou não, mostram bem como a realidade vivida pode ser retratada, e/ou relembrada, de modo bem assertivo.
E também não deixa de ser curiosa a forma como as então jovens enfermeiras evidenciaram a sua solidariedade com quem estava de serviço e arranjaram modo de mitigar as saudades dos familiares e amigos/as.
Um beijinho.
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