domingo, 5 de janeiro de 2020

P1198: VELHAS HISTÓRIAS DO JUVENAL AMADO / 3

O HOMEM GRANDE, A BAJUDA E O FUZILEIRO

UMA HISTÓRIA DE AMOR

Saltinho ficava isolado na época das chuvas, chegando a haver rotura nos produtos alimentares. Quando se chegava à situação de nem haver arroz, era grave.

Esta era uma dessas ocasiões e a única solução era a Aldeia Formosa dispensar-nos alguns géneros.

Assim, deslocámo-nos alguns quilómetros para uma zona onde o Rio Corubal podia ser atravessado por canoas.

Chegados à beira do rio, montou-se segurança e aguardámos que a travessia se concretizasse.

Lá vinham os barcos com a nossa bianda, mas também vinham a bordo várias mulheres.

A travessia não estava a ser pacífica. Entre as mulheres notava-se alguma agitação. Com o aproximar dos barcos, também vozes e choro se começaram a tornar audíveis.

As canoas encostaram à margem, descarregaram-se os sacos de bianda ao som de choro de uma jovem, talvez com quinze ou dezasseis anos. As mulheres mais velhas, talvez umas quatro, ralhavam e seguravam a bajuda, que de forma alguma queria desembarcar e muito menos subir para a minha Berliet.

Nós, os soldados, assistíamos sem podermos intervir, pois aquele caso era quase assunto de Estado.

A bajuda vinha para casar com o Homem Grande da Tabanca de Campala. Homem muito importante das relações (quando tinha que ser) do General Spínola.

Quando os soldados souberam o que se passava, logo ficaram do lado da jovem – “O filho da p*** do velho!

Chegados ao destacamento, logo a jovem foi empurrada para a tabanca e para o seu destino, em que se tornaria a décima mulher do Homem Grande.

Tinha deixado em Aldeia Formosa o grande amor da vida dela, um jovem fuzileiro nativo.  Estava inconsolável.

A noite chega rápido naquelas paragens.

Ao amanhecer, com a chegada de um helicóptero - que foi directo à aldeia - viemos a saber do sucedido.

O noivo, na noite de núpcias, entendeu mesmo contra vontade da noiva, exercer os seus direitos de macho. A noiva após ter esgotado por todas as formas, evitar que ele lhe tocasse, resolveu o assunto, pegando no pau do pilão e partindo uma perna ao marido

desditoso foi evacuado mais rápido, do que se fosse um soldado ferido em combate.
A acção psicológica assim mandava…

A jovem foi presa debaixo de uma árvore, com as mãos e pernas presas. Ia ser vergastada e ficaria presa mais de trinta dias.

Logo começou uma romaria de soldados que lhe levavam toda a espécie de guloseimas. Laranjada, latas de conserva, doce e pão. Enfim, gerou-se uma onda de solidariedade, que levou a que a pena não fosse cumprida.

Os pais da noiva terão finalmente devolvido o dote que o Homem Grande tinha pago por ela.

Ela voltou para Aldeia Formosa, com o coração a sair-lhe do peito. Lá estava um certo fuzileiro, que de certo não esperaria um final tão feliz.

Não fosse a coragem dela...

Juvenal Amado

2 comentários:

Hélder Sousa disse...

Caro Juvenal

Histórias de coragem e de determinação estão sempre a ocorrer.
Acontece que nem sempre (raramente) obtêm visibilidade.
Fizeste bem em nos dar a conhecer este caso.

Hélder Sousa

ildeberto medeiros disse...

Estes homens Grandes tinham todo o direito sobre as pobres mulheres jovens mas este enganouse isto ja devia ter acabado a muitos anos porque andei por ai nesta guine e vi com os meios um destes homens grandes tinha 4 ou 5 mulhers muitas das quais jovens e caras lindas nao faziam nada as pobres muhleres e trabalhavam para eles