NATAL – UMA ÉPOCA MÁGICA
Juvenal Amado |
Tanta coisa que soava a agressão, para
quem não podia reclamá-las.
A mãe fazia os fritos de abóbora, a
batata doce frita em rodelas envoltas em açúcar e canela e uns bolinhos também
fritos a que chamam hoje carolinas.
Era uma azáfama com que se preparava o
festejo.
Comiam carne pois de bacalhau estavam fartos, eventualmente havia laranjada, bebia-se café de cevada e petiscavam os fritos e bolinhos.
As crianças deitadas agitadas mal
dormiam para ir ao sapatinho onde as esperavam as alegrias que o menino Jesus
lá tinha deixado - e também desilusões.
O comboio tinha ficado nalguma estação e
a boneca tinha ido parar por engano a outra casa. A título de justificação o
pai e mãe diziam que iam ver como tal tinha acontecido.
O pai fazia a maior parte dos brinquedos
às escondidas. Pistolas e espingardas, camas e guarda-roupa para as bonecas.
Era tudo lindo, a que se juntava uns lápis e chapéus de chocolate.
O tempo foi passado e, na vez de brinquedos, começaram a receber umas meias, uns sapatos, uma mala para a escola – material que há muito fazia falta. Rapidamente se passou dos brinquedos para as necessidades mais prementes.
Os Natais foram melhorando em função dos
filhos que logo que saídos da escola iam trabalhar. Perdia-se a magia em troca
de mais alguns bens que se podiam comprar.
Para o filho mais velho o Natal teve
mais tarde outro significado, que foi o da saudade, quando em África passou
três Natais seguidos.
O tempo corria lento e pesado, o suor corria denso encharcando o caqui nas longas noites de serviço ou em patrulhas esgotantes e perigosas. Não pensava no regresso pois era doloroso, embriagava-se e espantava assim a melancolia junto com os camaradas. Para casa escrevia que tinha sido bom e que estava bem.
Em Abril de 74 regressou a casa. Para
trás ficou um muro de recordações de bons, assim/assim e inesquecíveis maus
momentos.
Perderam-se os convívios, os calores humanos, tinha regressado - mas nunca totalmente. O que se perdeu lá ficou no passado por vezes sangrento, feito de medo e solidão, que hoje será coragem.
Casou, teve filhos e finalmente reviu-se
nos Natais passados ao assistir à agitação dos mais pequenos na antevisão das
prendas no sapatinho.
E a magia voltou a acontecer.
17
de Dezembro de 2024
Juvenal Sacadura Amado
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