Como alcobacense de gema, o nosso
camarigo JERO traz-nos hoje uma história de um herói da sua terra envolvido
numa aventura que, não tendo sido totalmente concretizada, até teve um final
feliz…
OS HERÓICOS
MALUCOS DAS
MÁQUINAS VOADORAS
A
partida para a travessia entre Portugal e Nova Iorque estava agendada para 13
de setembro de 1931, junto a Vila Franca de Xira. Acompanhado dos alemães Wily
Rody e Christian Johansen, o jovem Fernando Costa Veiga, de apenas 22 anos,
assumiu o leme do avião, apostando numa viagem aérea baseada essencialmente na
bússola.
O
trio de pilotos percorreu mais de 7 mil quilómetros, mas um violento temporal e
a paragem do único motor da aeronave fez terminar o sonho de forma abrupta.
Tinham passado 24 horas e 21 minutos da descolagem em solo português.
A tripulação foi obrigada a amarar em pleno oceano, quando estavam “apenas” a 150 quilómetros do continente americano. Seguiu-se uma autêntica odisseia que confirma que a resistência humana (quase) não tem limites. Mas que foi uma autêntica tortura para os três amigos... foi.
Segundo a página “Voa Portugal - O
Portal da Aviação Portuguesa”, o avião ficou sobre as “ondas alterosas de um
oceano enfurecido, mais precisamente nas coordenadas 45º N e 54º W”.
Os três aventureiros
viveram dias difíceis – muito difíceis - uma vez que não tinham alimentos nem água
potável.
Costa Veiga, Rody e Johansen foram
recolhidos após uma semana no mar, mais concretamente 158 horas após o naufrágio,
pela embarcação norueguesa “Belmoira”, que os acolheu. Os aviadores seguiram
viagem para a Rússia, que era o destino do “Belmoira”.
O caso foi seguido com grande atenção
pela imprensa portuguesa, enquanto a família aguardava por boas notícias. A mãe
de Fernando Costa Veiga recebeu um telegrama, segundo se pode ler nas páginas
do “Diário de Lisboa” de 22 de setembro de 1931, das mãos “do boletineiro
Armando Tavares”, que dizia: “Depois de flutuarmos ao sabor das ondas durante
158 horas, fomos recolhidos pelo barco Belmoira, da praça de Oslo. Estamos
todos bem”.
A pedido da mãe de Costa Veiga, o
ministro dos Negócios Estrangeiros telegrafou ao ministro em Berlim pedindo-lhe
para “transmitir as notícias às famílias de Wily Rody e Christian Johansen ” e
ao ministro nos Estados Unidos para comunicar tudo o que soubesse sobre os
tripulantes do ESA.
Segundo o “Correio da Manhã” de
quinta-feira, 15 de outubro de 1931, o acto heróico de Costa Veiga e seus pares
ressuscitara “as virtudes da raça lusitana”. O jornal fala de um “feito de
relevo, digno de igualar-se às proezas dos grandes ‘ases’ da aviação”. “O
círculo da sorte afastou-se na última rodada, porque o grande pássaro de metal
fora visto a voar a cerca de 400 milhas de Nova Iorque.
“O ESA, obrigado a fugir a uma espera
traiçoeira que a tempestade lhe fizera no caminho da sua rota para a grande
cidade, tivera que descer em pleno Atlântico, lutando durante oito dias e 14
horas contra as vagas alterosas, contra a procella e contra a morte”, pode
ler-se na reportagem publicada pelo periódico.
Fernando Costa Veiga nunca duvidou do
êxito da epopeia, tendo assegurado aos familiares que não pereceria na viagem.
“Vão ver que não morro. E, se morrer, isso que tem? Não temos de morrer
todos?”, dizia na imprensa da época o futuro engenheiro eletrotécnico, que
durante os dias em que esteve à deriva se alimentou, juntamente com os dois
germânicos, de... peixe cru.
Fernando Costa Veiga tinha tirado a
licença de voo na cidade alemã de Leipzig a 11 de julho de 1931, ou seja, apenas
dois meses antes de se meter numa aventura tamanha. A sua falta de experiência
de voo foi apontada como uma das causas para o insucesso da travessia, mas o
seu estatuto de herói permanece inalterado.
Depois de terminar o curso de engenharia
eletrotécnica, este alcobacense de adoção foi o responsável pela presença em
Portugal da Citroen, marca à qual esteve ligado durante muitos anos. E nunca
deixou de visitar a nossa região. O pai e o avô eram naturais de Alcobaça e
detiveram, durante décadas, o palacete Costa Veiga, na Rua de Baixo.
Comprova-se a relação de Fernando Costa
Veiga com a nossa região voltando à notícia do “Diário de Lisboa”, que termina
com o seguinte parágrafo: “A família do bravo rapaz, que parte amanhã para a
Nazaré, pede-nos que sejamos intérpretes da sua gratidão junto de todas as
pessoas que se interessaram pela sorte do seu filho”.
Costa Veiga faleceu em 1993, com 84
anos. Pode não ter conseguido completar a travessia do Atlântico Norte, mas
ganhou um lugar na história da aviação.
Hoje em dia, a viagem entre Lisboa e
Nova Iorque faz-se em sete horas. Mas não tem, certamente, a mesma emoção de
outros tempos…
JERO
9 comentários:
Agradeço ao Jero a transmissão desta odisseia que desconhecia.
O que o Jero, não descobre?!..
Realmente houve grandes aventureiros de sangue "Luso".
Nos ares, nos mares... Um orgulho para todos nós pelos seus feitos!..
Um abraço, amigo Jero com votos de feliz Páscoa.
Mª Arminda
Mito obtigado querida aminga.Páscoa feliz para si e para os seus
JERO
"Mas não tem, certamente, a mesma emoção de outros tempos..." diz o Jero!
Pois claro que talvez não, mas ainda bem, pois a viagem do Veiga era, por assim dizer, uma viagem individual (ele e mais dois), uma espécie de viagem exploratória, uma espécie de pioneirismo, e actualmente as viagens são "o pão nosso de cada dia", movimentando em simultâneo largas centenas de aviões (pode-se ver o 'formigueiro' no site "flight radar 24", por exemplo) com milhares de passageiros.
E, mesmo assim, de quando em vez também há "emoção" em excesso....
Mas sim, há ao longo dos tempos histórias diversas, quase sempre ignoradas ou pouco divulgadas, de portugueses que foram capazes de se distinguir dos demais, com actos de génio e de coragem.
Hélder Sousa
Obrigado pelo teu comentário Hélder.E tocaste num ponto que nos é muito caro.Os portugueses que foram capazes de se distinguir dos demais, com actos de génio e de coragem.E foram muitos. Embora nalguns casos tenham passado ao lado da história. Na medida do possível temos obrigação de reparas esses hiatos- Páscoa feliz.
JERO
Obrigado Jero.
Já me tinhas contado a história de viva voz, mas é bom que fique aqui registada.
Portugal tem grandes Portugueses!
Um abraço
Joaquim
No dia 25 de Janeiro de 2018 tive o enorme prazer de assistir no salão nobre do Palácio da Independência, em Lisboa, a uma excelente conferência dada pelo Prof. Henrique Henriques Mateus, que teve a oportunidade de privar com Fernando Costa Veiga. Que vôo incrível e atribulado o destes 3 intrépidos aviadores !!! Que exemplo de coragem e de inconsciência perante os perigos intrínsecos ...
Também estive na conferência de 25 de Janeiro e apreciei bastante o relato da entrevista feira ao Fernando Costa Veiga pelo orador. Excelente. Uma aventura com fim feliz.
José Santos
https://ex-ogma.blogspot.com
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