A TER QUE IR À BRUXA…
Miguel Pessoa |
Terminado o curso de pilotagem em
Novembro de 1969 e garantida a minha entrada no quadro permanente da Força
Aérea, sem outros compromissos a apoquentarem-me decidi investir na aquisição
de um carro mais moderno. Na altura o NSU TT 1200 estava na moda, sendo
bastante utilizado nos rallies. Longe das performances dos carros de hoje era
no entanto um carro interessante e agradável de conduzir, pelo me decidi a
trocar o Hillman Imp que tinha pelo NSU TT.
Infelizmente o exemplar que comprei parece
ter sido perseguido pela adversidade, acabando por se finar com apenas seis
mesitos de idade. Ainda antes do estouro final, já duas desgraças me tinham
sucedido com aquele carro pois duas semanas antes, quando contornava o clube de
oficiais da BA2, Ota, deparei-me com uma camioneta de transporte que, parada
junto à porta do armazém resolveu de repente fazer marcha-atrás sem confirmar
se tinha o caminho livre… Sem tempo para eu reagir, a traseira da camioneta
entrou pela frente do carro, deixando esta bastante amarrotada…
Tentando ultrapassar esta contrariedade
contactei um mecânico civil que trabalhava na Base e simultaneamente fazia uns
biscates num oficina no Carregado. Assim, lá levou ele o carro… para me
aparecer duas horas depois, com ar constrangido, a informar-me que no percurso
para o Carregado um condutor mais desatento tinha resolvido entrar pela parte
de trás do carro, deixando-a igualmente amarrotada…
Depois dos arranjos adequados, duas
semanas depois - numa 6ª feira - tinha
eu finalmente em mãos o carro, à primeira vista completamente recuperado. Mas
nesse fim-de-semana não poderia testar a condição em que se encontrava pois
tinha marcada uma missão de navegação para Madrid, em T-33.
Regressado à Ota na 2ª feira, lá pude
finalmente ir testar o comportamento do carrito, tendo-me acompanhado para o
efeito o Aspirante SV, pessoa com quem tinha um bom relacionamento. A estrada
que liga a parte alta com a parte baixa de Alenquer era sinuosa e pejada de moradias, não permitindo velocidades muito elevadas. Claro que os 60 ou 70
Kms/hora a que eu seguia já eram uma velocidade razoável, principalmente se
tivermos em conta que numa das curvas encontrei espalhada uma quantidade grande
de cascalho de construção que tinha escorregado de um montículo existente ao
lado da estrada.
O carro pareceu ganhar patins e
percorreu rapidamente os 3 ou 4 metros de distância que o separavam da árvore
mais robusta da zona… e ali se enfiou. Para quem não se lembre do NSU TT, posso
acrescentar que era um carro bastante seguro… enquanto não saía da estrada. Com
o motor colocado atrás, a parte da frente (a bagageira) era oca e funcionava
como um harmónio numa colisão frontal. Como acertei na árvore mais do lado
direito do carro, foi esse o lado que mais encolheu – os faróis foram
encostar-se ao painel e a roda direita veio encostar-se ao banco do pendura,
deixando este em maus lençóis…
O carro passou a assentar em cinco pontos no chão - as quatro rodas e uma parte empenada do chassis... E da análise à parte amassada do carro verificou-se que na sequência do embate tinha deflagrado um princípio de incêndio na caixa dos fusíveis, pronta e afortunadamente debelado pelo rebentamento dum extintor que eu tinha guardado na bagageira. Um sistema de corta-fogo que na época as equipas de Fórmula 1 não desdenhariam ter...
O carro passou a assentar em cinco pontos no chão - as quatro rodas e uma parte empenada do chassis... E da análise à parte amassada do carro verificou-se que na sequência do embate tinha deflagrado um princípio de incêndio na caixa dos fusíveis, pronta e afortunadamente debelado pelo rebentamento dum extintor que eu tinha guardado na bagageira. Um sistema de corta-fogo que na época as equipas de Fórmula 1 não desdenhariam ter...
Resumindo, resultou desta cena que
acabámos os dois num quarto do Hospital Militar, eu na cama da esquerda, ele na
cama da direita – precisamente como íamos no carro... Mais grave o estado do
meu pendura – tinha fracturado o fémur em dois sítios e rasgado o nariz – nem
por isso eu fiquei muito melhor pois para além de amarrotar a fachada (onde ainda levei uns tantos pontos) fracturei
o colo do fémur, o que me originou uma imobilização ainda grande no hospital e
um período de 6 meses até poder voltar a voar.
Claro que com esse atraso lá se
foi o curso de T-33 que estava a frequentar: Quando voltei à Ota os meus
companheiros de curso já tinham arrancado para a BA5, Monte Real… e eu
ingressei no curso seguinte, entretanto iniciado por novo grupo. Resultou daqui
um atraso irrecuperável na minha preparação para uma comissão em África, tendo
por esse motivo sido o último a partir para essas bandas, com um atraso de
cerca de 6 meses a um ano em relação aos outros do meu curso original.
Embora com uma recuperação mais lenta
que a minha, penso que o meu companheiro de infortúnio SV não terá ficado no
entanto com mazelas psicológicas relativamente às velocidades na estrada, pois
tive a oportunidade de ver nos jornais da especialidade que ele terá mesmo
participado em rallies nos anos seguintes…
O NSU TT ficou irrecuperável, como se deduz pelas fotos, mas eu ainda teria mais dois anos até terminar as
minhas qualificações e arrancar para a minha comissão em África. Por isso
estava nos meus planos adquirir uma nova viatura, plano que comecei a desenhar
ainda deitado na cama do Hospital. Mas isso será desenvolvido num terceiro e último texto que irei publicar aqui…
Miguel Pessoa
4 comentários:
O NSU era uma grande máquina.
Miguel
Nem sei que dizer!
Será que esses episódios com o NSU Prinz TT não poderiam ser premonições para 'outras coisas', por exemplo "strellas"?
Por outro lado fico já, antecipadamente, preocupado com essa terceira viatura a adquirir. O que lhe estará reservado? O que lhe acontecerá?
Abraço
Hélder Sousa
Miguel
Temos que fazer um filme sobre este NSU. Tem peripécias suficientes.
MAS... (como diz o Helder), não seriam esses "mergulhos" (para a frente) premonição de outros "mergulhos" futuros do condutor (sem carro) em que usou uma omoplata como para-choques?
Abraço
Alberto Branquinho
Amigo . Lá diz o ditado, "não há duas, sem três..."
Acontece a muito boa gente. Há dias fui eu que conduzo desde 1962, a espetar-me pela primeira vez numa carrinha Mercedes..
O meu não ficou em bom estado e ainda estou a aguardar como irá ficar.
Coisas da vida que acontece a alguns de vez em quando.
Aguardo a terceira história. Até lá um abraço.
M Arminda
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