José Versos Cravino faleceu na Covilhã em 5 de Fevereiro de 2020.
Reproduzo um texto que tem mais de 55 anos e que
faz parte do DIÁRIO da Companhia de Caçadores 675, editado em 1965!
JERO
UM “BON VIVANT…”
Estas crónicas ficariam mais pobres sem a riqueza da personagem de que a seguir nos ocupamos.
Chama-se José Versos Cravino, é natural da Covilhã e já foi, em tempos que já lá vão, Furriel Vagomestre da Companhia. Dificuldades de adaptação e outros relacionados com os primeiros tempos da Guiné fizeram com que “mudasse” de especialidade depois de, sozinho, ter conseguido atrapalhar pelo menos uns dez indivíduos que tentaram terminar o seu primeiro mapa do rancho.
Já no mato, sem ter nos bolsos das suas calças facturas do rancho, passou a
Furriel de Armas Pesadas, começando a sair em patrulhas com a sua Esquadra.
Continuava pouco ambientado, autenticamente abstracto, “aéreo” (como lhe
chamavam os seus camaradas), sempre só com os seus pensamentos e os seus problemas,
quase sem sair da sua camarata, mais parecendo um plantão à dita de que um
Furriel com tarefas de responsabilidade…
Um dia ia-se matando no seu "quarto" ao tirar um carregador da sua
“G3” que, por sua culpa, se disparou. A bala passou-lhe por debaixo do braço,
rompeu-lhe a camisa e foi furar uma telha mesmo por cima da sua cabeça.
Com este “tratamento de choque” começou aí talvez a sua recuperação.
Entretanto terminaram os trabalhos da pista de aviação de Binta e com o
primeiro avião “aterrou” também o Furriel Cravino, que se modificou
completamente para melhor. Umas semanas depois “tínhamos” em Binta um Cravino
de que ninguém já se lembrava. Mais nutrido, de excelentes cores e a falar
pelos cotovelos…
Seguia “desenrascado” para operações militares no mato com sorriso nos lábios, dizendo bem humorado que se os terroristas aparecessem ele lá estava para lhes mandar umas morteiradas nos cornos…
Os meses foram passando e o Cravino, de figura “apagada” passou ao primeiro
plano; e onde havia risota, boa disposição e um “petisco” já se sabia que lá
estava o nosso Furriel de Armas Pesadas. O “aéreo” passou a “bom vivant” sem
problemas ou complexos.
Embora de maneira diferente do Furriel Moreira ele é, à sua maneira, um
indivíduo desenrascado, embora comodista. Enquanto o Moreira vai à caça para
arranjar um petisco, o segundo aparece quando o petisco já está pronto a ser
comido…
Esquece-se com frequência de comprar tabaco, sabonetes, lâminas, cremes de
barbear, papel higiénico, fósforos, etc., e vai pedindo o que precisa ao
parceiro mais próximo, dizendo sempre nessa alturas “que aqui temos que ser uns
para os outros…”.
Gosta de fazer umas “partidas” aos amigos e também aceita com um sorriso as que lhe fazem. Já sofreu algumas dos seus camaradas, que também não perdem a oportunidade de se “pagaram com a mesma moeda”…
Há dias em que tem os seus azares e ainda há pouco tempo, quando esteve a “treinar” assinaturas num papel de máquina de escrever, deixou o “documento” abandonado na Secretaria do 1º Sargento Santos e acabou por ter de pagar 3 cervejas a um seu camarada que aproveitou uma das assinaturas para fazer um vale, que fez chegar à Cantina… Ele encaixou com desportivismo a “piada” e continuou bem disposto e a animar com a sua presença Binta, onde já era figura de primeiro plano.
É indiscutivelmente um grande “ponto” o nosso amigo Cravino.”
Nesta hora de partida recordamos-te
com muita saudade. E não te esquecemos.
Até um dia, José Versos Cravino!
JERO
5 comentários:
Olá JERO!
Mais um "que partiu" e mais um que fazes questão de lembrar/homenagear.
Muito bem!
O que fez mudar a postura do Cravino não se consegue saber ao certo.
Talvez o tal tiro fortuito, talvez. Mas não será certo. Pode ter havido alguma outra coisa.
Seja como for (ou terá sido) a verdade é que parece ter deixado de ser uma espécie de "zombie" e passou a ser um "ser vivente", com as suas características próprias.
Em certa medida, não é assim uma evolução tão estranha. Hoje por hoje há muita gente assim.
Um abraço
Hélder Sousa
Obrigado meu camarigo Hélder Sousa.
Saudades de Alcobaça.
JERO
O capítulo humano da guerra na Guiné chegaria para infindável livro,ou talvez antes....infindável enciclopédia !
Um grande abraço do J.Belo
Obrigado Camarigo José Belo.
Saudades de Alcobaça e votos de muita saúde,
JERO
Gostei de ler a história sobre o Furriel Cravino.
Sabe-se lá qual teria sido o clique, que fez mudar a sua postura." Há razões que o homem desconhece".
Desejo que se encontre em Paz.
Mª Arminda Santos
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