quarta-feira, 8 de julho de 2020

P1240: DESVENTURAS DOS AMIGOS SUECOS

Um artigo que nos foi enviado pelo nosso camarigo luso-lapão José Belo, 
que relata as desventuras do Governo sueco no apoio prestado na área da Saúde
à República da Guiné-Bissau após a sua independência.

ELEFANTE BRANCO EM HISTÓRIA NEGRA

José Belo
Após a independência  a Guiné procurou obter avultados apoios económicos da Suécia  para o sector da saúde. Um moderno laboratório clínico fazia parte prioritária da lista apresentada.

O Departamento Estatal Sueco para o auxílio aos países em desenvolvimento (S.I.D.A) estava dividido entre consultores com opiniões díspares.

Deveria ser um laboratório de elevado nível internacional?
Ou antes um laboratório adaptado às realidades guineenses, capaz de funcionar com pelo menos cinco paragens de electricidade diárias e pessoal não especializado?

O Instituto Karolinska na Suécia
Como o auxílio a ser prestado deveria respeitar os desejos dos recebedores... ambas as sugestões foram apresentadas ao Presidente guineense.

Este, sem o mínimo de dúvida, decidiu-se pelo modelo de laboratório mais avançado… e de custo mais do que duplo!

Argumentou o Presidente ser este o modelo que correspondia ao seu sonho de uma Guiné desenvolvida em futuro próximo.

As realidades vieram dar razão aos críticos:

O funcionamento parava continuamente.
Os cabos eléctricos e os compressores queimavam-se regularmente.
O sistema de refrigeração avariava-se.
O fornecimento de água era irregular devido a problemas da canalização.

O laboratório passou a ser conhecido como o elefante branco…
A S.I.D.A. desejava acabar com os apoios mas, graças aos esforços e muita dedicação dos trabalhadores do laboratório, este lá se foi arrastando até 1998.

Dá-se a guerra civil e o laboratório acaba por ser atingido por algumas granadas, iniciando-se um importante fogo.
Como pode o laboratório sobreviver a todos estes incidentes?
Como são hoje analisados os resultados?

Todos os apoios aos mais variados sectores da Guiné acabaram por falhar, decidindo a S.I.D.A. terminar com a cooperação económica no início dos anos 2000.
(2,2 mil milhões! Tendo sido a Guiné o país que recebeu maior auxílio económico per capita).

A cooperação por parte do Instituto Sueco da Saúde Pública também terminou então.
O laboratório passou a ser financiado por diversos Institutos Suecos de Investigação.
A universidade sueca de Lunde, através de um grupo de investigadores e do laboratório, tem vindo a estudar um tipo especial de hiv-aids que existe na Guiné, chamado de hiv-2.
Os resultados foram já apresentados em publicações científicas tendo gerado grande interesse quanto a vir a ser criada uma vacina.

Hoje considera-se terem sido estes apoios económicos contra-produtivos para o país, o qual, deste modo, não sentiu necessidade de mobilizar os seus recursos próprios.
Ao terminarem os apoios criou-se um vazio económico, agora preenchido pelas avultadas verbas do tráfego internacional da droga.
Revista -“Om världen”
Mats Sundgren


3 comentários:

Ley Garcia disse...

Para não variar, a subsídio dependência acaba por ter maus resultados no longo prazo

JB disse...

*De boas intenções o inferno está cheio *

Por vezes os provérbios aplicam-se como por encomenda.

“O auxílio a ser prestado deveria respeitar os desejos dos recebedores “.......independentemente de os mesmos terem sido analisados de forma extremamente crítica por parte de especialistas ao serviço dos doadores!

E lá vem à memória a velha cantiga infantil:
-Se um elefante incomoda muita gente...dois elefantes incomodam muito mais!

Um abraço do J.Belo

Miguel disse...

Um comentário do José Belo, de 9JUL2020, inserido num texto do blogue da Tabanca Grande (Post 21155) sobre este mesmo assunto:

Assunto: A propósito do texto publicado na Tabanca do Centro.

O artigo lá publicado sobre a Guiné é, infelizmente, mais um dos infindáveis que hoje se podem encontrar nos arquivos da imprensa sueca das últimas décadas.

Saúde Pública, Educação, Agricultura, Pescas, Transportes, Indústria Alimentar, Refrigerantes, Investimentos e outras actividades bancárias..., as conclusões das Comissões Estatais suecas que as analisaram (demasiadamente tarde!) são quase fotocópias nos seus negativismos.

Houve, nos anos sessenta e setenta, um genuíno interesse, por parte das sociedades escandinavas, em preencher os vácuos criados por seis séculos de Administração colonial.

Seria incapacidade? Seria não vontade?

A política spinolista "Por uma Guiné Melhor", surgida a contra corrente de todo o desinteresse anterior, apesar de tardia, limitada por uma situação de guerra então já bem implantada, não dispondo das muito avultadas verbas necessárias, ainda conseguiu por um curto espaço de tempo criar condições sociais únicas cujos resultados nos deixaram antever o que poderia ter sido se a política do governo colonial tivesse seguido o caminho do desenvolvimento.

"Quanto mais atrasados , educacional e socialmente, mais fáceis de governar": poderia ter sido a definição concisa da Administração Colonial. Princípios não só aplicáveis em África mas também em Portugal.

Em ambos os locais os resultados finais desta política de "Iluminismo saloio" falaram por si. Muito fácil, e limitativo, o apontarem-se como raízes de todos os erros (muitos e graves) os tempos pós-Abril de 74.

Mas está "bagunceira" final foi criada por uma longa e abrangente história de criminosas incompetências políticas, sendo Goa um bom exemplo das mesmas.

Alguns (!) dos "actores " deste histórico final de época em 74, fossem eles militares ou civis, mais não foram que pequenos palhaços de um vasto circo de interesses internacionais que em tudo os ultrapassava e...ultrapassou!

Apesar de todos os tão saudosistas "velhos do Restelo ", as gerações do nosso querido Portugal de hoje poderão cometer muitos erros e...certamente o fazem! Têm no entanto uma possibilidade não disponível a tantas e tão sacrificadas gerações anteriores: podem fazê-lo em LIBERDADE !

Um abraço do J. Belo.