A MATA
Caminhas,
sentindo a pele molhada, quase pegajosa, por causa daquela constante humidade,
por causa daquele calor sufocante.
Dentro de ti há um misto de medo e de
determinação, que vai obrigando o coração a bater mais depressa, praticamente
compassado com cada passo que dás.
A mata envolve-te, árvores altas,
arbustos baixos, coisas que deveria ser lindo ver, não fossem as circunstâncias
em que estás envolvido.
Olhas para trás e vês os teus homens que
te seguem, uns com um semblante apreensivo, outros com uma calma aparente.
Querias poder transmitir-lhes paz e
serenidade, mas sabes que também tu não estás tão calmo e sereno como aparentas
estar.
À tua frente apenas o guia, um
guineense, filho da terra, em quem confias para te guiar mata adentro.
Por um breve momento voltas a casa dos
teus pais, à tua vida anterior que agora parece tão longe, e um tímido sorriso
chega à tua boca, e deixas-te levar pela saudade.
Abanas a cabeça para sair desse torpor,
pois sabes bem que ali, naquela mata, a distração pode ser fatal.
Queres olhar para além da vegetação que
ladeia o trilho em que caminhas, mas se há espaços em que consegues ver mais
longe, a maior parte do tempo apenas caminhas quase sem ter a noção certa do
que te rodeia.
Levantas a cabeça, enches o peito,
endireitas-te porque, caramba, és tu que tens que dar o exemplo, é a ti que os
homens devem seguir com confiança e esperança.
Cada um deles, ao longo destes meses já
passados, tornou-se num amigo teu e preocupa-te mais o seu bem estar naqueles
tempos difíceis, que o teu próprio bem estar.
Sentes que deves a cada um deles a
promessa a cumprir de os fazer regressar a todos ao aquartelamento primeiro, e
depois, quando for tempo disso, regressar à casa que deixaram lá longe, ou até
mais perto.
Vais ouvindo os barulhos da mata, o
vento nas árvores, os animais que “falam” uns com os outros, os cheiros que já
vais conhecendo bem, e continuas avançando como que a dizer que aquela mata
agora é tua e de mais ninguém.
De repente percebes que um silêncio
profundo se instalou.
Não se ouve nada, nem vento, nem
animais, parece que até os cheiros deixaram de cheirar.
Numa fracção de segundo tomas
consciência de que algo está errado, e gritas para os teus homens se prepararem
para aquilo que vai acontecer.
Os cheiros regressam, mas são cheiros de
pólvora.
Os animais já não “falam”, mas ouvem-se
os gritos dos homens e a “voz” das armas.
Num instante, que parece uma eternidade,
tudo termina.
Olhas apreensivo para todos e todos te
devolvem o olhar, alguns com o medo espelhado nos olhos, outros com um olhar de
alívio imenso.
Olhas para o céu, por entre as árvores,
e tu, que nem costumas rezar, pensas apenas: Obrigado, meu Deus!
Marinha
Grande, Novembro de 2025
Joaquim
Mexia Alves












