sábado, 31 de janeiro de 2015

P601: REVISTA "KARAS" DE JANEIRO


P600: 76 AGUERRIDOS PARTICIPANTES NO CONVÍVIO DE 30JAN



Nesta data enviámos aos participantes no 42º encontro as fotos tiradas pelo Miguel Pessoa no decorrer do convívio. Se estiveste presente e não recebeste as fotos, então certamente não disponibilizaste um endereço e-mail para as poderes receber.

Ainda estás a tempo! Envia um mail para tabanca.centro@gmail.com para te podermos encaminhar as fotos. 

quinta-feira, 29 de janeiro de 2015

P599: JERO - CRÓNICAS DOS TRIBUNAIS / 3

 PERGUNTAS SOBRE “VIDA FÁCIL”…
COM RESPOSTA DIFÍCIL…

Em 1948 falou-se no Mundo sobre o “paralelo 38”, que se tornou a fronteira entre os países então criados: Coreia do Norte e Coreia do Sul.

A milhares de quilómetros dessa fronteira nunca os coreanos terão sabido nem suspeitado que a cerca de 12 kms de Alcobaça, bem perto da Nazaré, “nasceu” uma casa de prostituição que localmente ficou conhecida, enquanto durou, por “paralelo 38”.

Os frequentadores faziam-no com a discrição possível por motivos óbvios mas no decorrer dos anos 50 um trágico acidente ocorrido já de madrugada, numa das estradas que “desciam” do Sítio da Nazaré, provocou algumas vítimas mortais.

Vim a conhecer o processo no arquivo do Tribunal de Alcobaça durante o tempo em que fui “estagiário” em 1958. Recordo-me com emoção de ter visto nos “anexos” do processo duas “cadernetas sanitárias” das vítimas, que morreram por o carro em que seguiam ter capotado e depois se ter incendiado. As cadernetas estavam chamuscadas, mas era possível confirmar a identificação completa das jovens.


A história que se segue foi-me contada quando o julgamento já tinha ocorrido há alguns meses e não recordo do nome do magistrado que terá protagonizado a cena que passo a descrever.

Uma das testemunhas chamada a tribunal para depor sobre o acidente era uma das “meninas” do ”paralelo 38”.

No ato da identificação, já na presença do Juiz, respondeu sem hesitação aos dados sobre o seu nome e estado. Quando chegou à vez da “profissão” fez uma pequena paragem e, depois de olhar para o advogado da defesa, que lhe fez um aceno encorajador com a cabeça, respondeu: “Sou ‘matriz’, Sr. Doutor Juiz”.

O magistrado esboçou um sorriso e não resistiu a um pedido de esclarecimento: “E é predial ou urbana”?

A testemunha embatocou e respondeu com sinceridade: ”Sou das de “f.d.r”, Sr. Doutor juiz.

Foi a vez de o magistrado engolir em seco e… o julgamento continuou.

Mas a história da meretriz que, por alguns minutos, esteve perto de ser ”matriz predial e/ou urbana” ficou… para mais tarde recordar. E o registo aqui está mais de meio século depois!

JERO                  



segunda-feira, 26 de janeiro de 2015

P598: JÁ LÁ VÃO 5 ANOS...

ÉRAMOS 4, HOJE SOMOS MUITOS

9 de Dezembro de 2009. Dia de Inverno. Temperatura amena para a época.

Partida de Fátima, com o Juvenal na condução do seu Mercedes, de 4 lugares, descapotável e de alta cilindrada. 

O Juvenal não podia ultrapassar determinados limites de velocidade. Sempre atento, ia mirando as bermas das estradas, não estivesse o inimigo por aí emboscado. Com a memória ainda fresca dos acontecimentos vividos nas matas e picadas de Galomaro, o Juvenal impunha a si próprio uma condução cautelosa. O destino era Matosinhos onde, na  Tabanca Pequena, se ia proceder ao lançamento do livro de Manuel Maia, "A história de Portugal em Sextilhas".

Em Monte Real, o Mexia Alves decide-se por acompanhar o Juvenal, com a missão de observar meticulosamente a berma da estrada, não fosse o IN perder o tino.

Até à Figueira da Foz a viagem fez-se na máxima tranquilidade e segurança. Aí surge mais um camarada disponível para montar a segurança à retaguarda. O Almirante deixa o seu Porto de Buarcos e ameaça que, se na sua ausência algo de errado acontecer, ele avançará com o seu grupo de Nhacobá… 

Em Aveiro, nova paragem. Entra na viatura um quarto camarada para reforçar a segurança à retaguarda. Ainda meio atordoado, com os ares escaldantes  do Sul da Guiné, no seu subconsciente, promete ao grupo a maior dedicação e entrega, na segurança.   

Após uma média horária superior a 48 km/h estavam percorridos os 265 Km que nos separavam de Matosinhos. Fantástico!

Ali chegados tivemos direito a uma honrosa recepção, onde não faltou o chouriço, os carapaus fritos, a bianda e… o feijão. Ah! E um bom tinto da casa.

Servido o repasto e prestada homenagem ao Manuel Maia havia que regressar à base. Tudo correu normalmente até à área de serviço de Antuã, onde parámos para mudar águas.

Para nosso espanto encontrámos 3 oficiais, bem ataviados, que se faziam deslocar numa pequena viatura, antiquada e sem grande capacidade para transportar 3 oficiais. Enfim, duros tempos!

Estabeleceu-se de imediato um interessante diálogo com aquele pessoal, a quem o Mexia Alves deu lições da vida castrense. Indicou-lhe as chefias militares do Regimento de Artilharia do Porto, de outrora, as suas instalações e respectivas localizações.

A guerra da Guiné foi tema abordado, mas os oficiais aos costumes disseram NADA.

Perante tanto desconhecimento a revolta era latente em todos, e decidimos avançar na construção da nossa Tabanca para defesa dos nossos camaradas.

Era urgente definir objectivos e eleger as chefias.

O chefe, ainda não Amado, mas denunciando qualidades de liderança invulgares, foi eleito por unanimidade e aclamação.

A localização da Tabanca seria decidida pelo chefe.

O objectivo primeiro: Consistia, de imediato, na angariação de fundos para ajudar camaradas em situações mais críticas.

O objectivo segundo: Seria a tomada de assalto do Regimento de Artilharia do Porto, para apoio à nossa Tabanca, com data prevista para 2050.

Objectivo terceiro: Reocupação na Guiné dos aquartelamentos de Galomaro, Bambadinca, Cumbijã, Nhacobá, Guileje e Gadamael, previsto para 2060, bem conhecidos, em tempos idos, dos 4 intervenientes.

Deixámos finalmente Antuã com a sensação de dever cumprido.

Em Aveiro ficou o Manuel Reis onde iria organizar o grupo dos " Suspeitos de Costume", com o objectivo de suster o avanço de infiltrados.

Na Figueira da Foz o Almirante Vasco da Gama foi ordenar a protecção do seu Buarcos lindo, com o seu grupo de apoio.

O Chefe foi assumir o seu posto de Comando em Monte Real ao mesmo tempo que o Juvenal se dirigia para Fátima para mobilizar as tropas dispersas pelos arredores.

E foi assim o primeiro dia, do resto da vida da Tabanca do Centro (*).

Um abraço para todos os camaradas.
Manuel Reis


(*) Nota dos editores: Criação oficializada em 27 de Janeiro de 2010, com a realização do nosso 1º Encontro em Monte Real. Efeméride que vamos relembrar no próximo dia 30 de Janeiro com a realização do nosso 42º Encontro, 5 anos depois…


sexta-feira, 23 de janeiro de 2015

P597: SAIU NO "CORREIO DA MANHÃ" DE DOMINGO

Integrado na série de pequenos textos sobre a guerra de África, em que é dada voz a alguns dos combatentes que por ali passaram, foi agora a vez do nosso camarigo Vitor Caseiro dar o seu depoimento ao "Correio da Manhã". Apresentamos-vos o texto agora publicado, com a devida vénia àquele jornal.

Uma sugestão que fazemos a quem for convidado para falar. A exemplo do que fez agora o nosso amigo Vitor, entreguem o vosso depoimento escrito e não se fiem exclusivamente na capacidade do repórter em pôr no papel tudo o que lhe pretenderam transmitir.

Assim poderão evitar interpretações erradas daquilo que disseram ou até serem vítimas de uma eventual imaginação prodigiosa do repórter...

A Tabanca do Centro



Uma sugestão: A letra é demasiado pequena para se ler com facilidade? Podem aumentar o tamanho do texto premindo simultaneamente o botão "CTRL" (do lado esquerdo no teclado) e rodando o "scroll" (aquela rodinha no meio do rato...). No fim, para repôr o tamanho habitual, basta fazer a operação inversa.

terça-feira, 20 de janeiro de 2015

P596: IDEIAS AVANÇADAS... OU TALVEZ NÃO...

A PROPÓSITO DE UM LIVRO

Como tivemos já oportunidade de aqui referir, no final de Novembro, no anfiteatro do Estado-Maior da Força Aérea, procedeu-se à apresentação do livro “Nós, Enfermeiras Paraquedistas”. Por motivos que não conseguimos ainda compreender bem, o stock de livros disponibilizado para aquela sessão (à volta de 300) esgotou-se rapidamente, tendo muita gente ficado sem um exemplar sequer. E o momento, a dois passos do Natal, teria sido óptimo para possibilitar a compra de uns tantos livros para ofertar a amigos.

E o facto é que em meados de Janeiro ainda não estava disponível aquele livro para quem o quisesse adquirir, supondo nós que ele apenas aparecerá nos grandes espaços - FNAC, Bertrand, etc. – só lá para o fim deste mês…

Sendo uma das co-autoras, a nossa camariga Giselda Pessoa teve ainda assim a possibilidade de dispor de uns tantos exemplares, um dos quais decidiu enviar ao nosso camarada José Belo, auto-intitulado “exigrado” na Suécia, ou mais propriamente lá para trás do sol posto, (relativamente) próximo de Kiruna…

A resposta do Zé Belo, acusando a chegada do dito livro, é apresentada  a seguir, e com ela uma pequena história que ele achou por bem recordar:


“Caríssimos Giselda e Miguel

Um grande obrigado pelo livro (que já li de ponta a ponta!), que me chegou às mãos muito mais rapidamente do que seria de esperar nesta época do ano.

É difícil - creio mesmo quase impossível - para as jovens portuguesas de hoje compreenderem na sua totalidade o fantástico salto em frente que representou então a coragem social daquele grupo de jovens pioneiras.

Quando vim pela primeira vez à Suécia (acompanhando algumas "estrelas revolucionárias") compreendi frente às realidades aqui existentes que este país estaria (pelo menos!) mais de noventa anos à frente da nossa sociedade lusitana.

Mais tarde, e já depois de aqui viver, acabei por constatar que os tais noventa anos eram um cálculo demasiadamente "envergonhado".

As diferenças eram - e são - de tal modo vastas que muito mais de um século de evolução social (a todos os níveis) nos separa.

Daí talvez  compreender ainda melhor o que de "grande" foi a decisão daquelas jovens Páras.

A tal tão nossa ideia de "macho ibérico" quanto às suecas serem... muito dadas... mais não é do que as nossa dificuldade em aceitar que as raparigas, por aqui, são desde muito jovens encorajadas a proceder do mesmo modo que os rapazes, incluindo os procedimentos relacionados com o sexo.

A propósito... aqui segue história verdadeira que dá para sorrir.”

IGUALDADE ENTRE OS SEXOS…

Há cerca de quatro anos, algumas jovens educadoras a trabalhar nos inúmeros infantários de Estocolmo decidiram em reunião geral, e em nome da tal igualdade entre os sexos, que seria bom, desde os tempos de infantário, que tanto raparigas como rapazes deveriam... sentar-se na sanita para urinar…
Não haveria assim mais uma "diferença"!

Como Lisboa não é Portugal... Estocolmo não é a Suécia!

As inúmeras ironias, os artigos dos jornais da província, as revistas de teatro cómico, e até programas de televisão de rir à gargalhada, depressa obrigaram estas jovens "activistas" a deixarem os desgraçados dos miúdos mijar dentro, ao lado, ou fora da sanita... como sempre.

Um grande abraço

José Belo

sábado, 17 de janeiro de 2015

P595: CRUZES, CANHOTO!


Estamos a aproximar-nos do nosso primeiro convívio de 2015 - o 42º desde o início dos nossos encontros, em Janeiro de 2010. Estamos portanto a completar o 5º aniversário da nossa criação.

E consta que determinado Chefe Cozinheiro, sabendo do facto e tendo em conta o alto nível deste nosso grupo, resolveu associar-se às festividades, tendo-se oferecido à D. Preciosa para preparar o habitual prato de resistência dos nossos encontros, o Cozido à Portuguesa.

Infelizmente as coisas parecem ter corrido de forma menos feliz para ele pois, tendo sido solicitado a fazer prova da sua aptidão perante um júri seleccionado para o efeito, resolveu apresentar a sua versão "nouvelle cuisine" do cozido (versão "mignon"), do modo ilustrado na imagem abaixo:


Ao que parece, a dose não chegava para a cova de um dente - e em alguns dos presentes já se notava a falha de vários... - pelo que não se ficou a poder determinar a qualidade do cozinhado... Além de que, resmungava o júri, tem que se debicar qualquer coisinha enquanto se conversa com os companheiros do lado. Vai daí, foi decidido oferecer um par de patins ao famoso Chefe - que já deve ir abaixo de Lisboa (é sempre a descer) - e retomar os serviços do pessoal habitual da Pensão Montanha. 

Para o efeito preparou-se logo ali a versão original do cozido da Pensão Montanha, (a)provado por unanimidade, tendo sido dadas garantias pela D. Preciosa de que no próximo dia 30 de Janeiro o prato não será nunca de qualidade inferior ao degustado pelo júri, prato que apresentamos na foto abaixo, antes de ter sido devidamente estrafegado:


As inscrições estão a decorrer e a efeméride merece uma enchente de pessoal a comemorar o nosso 5º aniversário. Por isso avancem com a vossa inscrição, se ainda não o fizeram. Têm até às 12H30 do próximo dia 28 de Janeiro. Isso se não atingirmos os 80 inscritos antes dessa data, o que nos levará a encerrar antecipadamente as inscrições. Mais um motivo para não perderem demasiado tempo...

A Tabanca do Centro


Nota: Foto do "cozido mignon" retirada de httpmalomil.blogspot.pt , com a devida vénia. A foto do "cozido Maxi" foi tirada pelo Miguel Pessoa, e a vénia vai para a D. Preciosa, que o cozinhou...

domingo, 11 de janeiro de 2015

P593: JERO - CRÓNICAS DOS TRIBUNAIS / 2

OUTROS TEMPOS… OUTRAS DETERMINAÇÕES!

Em passado recente veio noticiado num jornal nacional (C.M., de 1.09.2014) que uma patrulha da GNR, da Lixa, tinha sido atacada à dentada, resultando ferimentos em dois militares. O agressor foi detido. De acordo com as autoridades o suspeito estava alcoolizado e andava aos saltos por cima de vários carros. Foi-lhe pedido para deixar o local , o que se negou a fazer, reagindo de forma violenta às ordens dos militares.

Esta situação fez-me lembrar uma história de outros tempos com algumas diferenças notórias e que se passou bem longe de Lixa…

Numa manhã de 2ª.feira foi apresentado no Tribunal de Alcobaça um indivíduo acusado de desobediência à autoridade. Segundo a participação circulava de motorizada sem capacete e quando mandado parar pelo militar da GNR teve comportamento desrespeitoso.

Interrogado pelo Juiz o réu não confirmou a acusação de que era alvo e queixou-se ao Magistrado que tinha sido mesmo agredido pelo militar da GNR.

O Juiz perante esta situação inquiriu o militar da GNR. 
” Então sr. Agente o que tem a dizer?”

- Saiba V.Exª. ,sr. Doutor Juiz , que o réu não obedeceu de imediato às ordens que lhe dei para parar a motorizada. Quando o fez efetivamente e me consegui aproximar dele insultou-me - chamou-me “policia de merda” - e cresceu para mim de forma agressiva.

Nesta altura fiz uso da força muscular que me está distribuída”.

Já não recordo a sentença mas que eram outro tempos…eram!

                                                                                                JERO




quinta-feira, 8 de janeiro de 2015

P592: LEMBRANDO A TI PEDROSA

UMA MEMÓRIA, UMA EMOÇÃO, UMA GRATIDÃO


Quando eu era menino - aliás mesmo já antes de eu nascer - vivia em casa dos meus pais uma senhora, sim uma senhora, que tendo sido empregada em casa dos meus avós paternos (que nem a minha mãe os conheceu pois morreram no principio do século xx, com o surto, salvo o erro, da pneumónica), nunca saiu de perto do meu pai, ficando assim a viver lá em casa.

Mais velha do que o meu pai (que nasceu em 1899), nunca quis deixar de trabalhar e assim tratava sobretudo da capoeira e, lembro-me bem, era quem embebedava o peru para o Natal.

Era carinhosamente tratada por Ti Pedrosa, e recebia sempre dois beijos de cada um de nós, meninos estudantes em Lisboa, sempre que regressávamos a Monte Real para os diversos períodos de férias.

Era família, tão família como qualquer avó muito querida, e que, mesmo tendo um pouco de seu, e mesmo depois dos sobrinhos da Argentina a quererem vir buscar, nunca quis sair de nossa casa, pois era ali que era a sua casa, a sua família.

De quando em vez fugia-lhe a palavra para o antigamente e tratava o meu pai por menino Olympio, numa ternura incapaz de aqui reproduzir, sobretudo por ver aquele homem grande enternecido por aquele tratamento tão íntimo.

Neste momento, já perguntam os meus “camaradas de armas” o que é que tudo isto tem a ver com a Guiné!
Perguntam, porque já não temos a mesma paciência que ela tinha em esperar pelas férias, para ver como tinham crescido os seus meninos e quase obrigar as galinhas a porem os ovos amarelinhos, (que agora já não existem), para nós comermos estrelados em azeite, numa frigideira tão velha que já tinha a gordura “incorporada”…

Pois nos idos do mês de Abril de 1972, (mais para a frente ou mais para trás do dia 6, data do meu aniversário) recebi no Xitole uma carta cujo envelope, escrito com caligrafia vacilante, tinha inscrito no remetente: Ti Pedrosa – Monte Real.

A letra não era dela, que não sabia escrever, mas de outra empregada que a seu pedido me dava os parabéns pelos meus 23 anos e servia de cobertura a uma nota de 20$00, para eu comprar o meu presente.

Calculam como o meu coração, já de si tão mole e sensível, enviou aos meus olhos a ordem para, com uma qualquer água, afastar o pó da Guiné e lubrificar a minha vista. Claro que aquilo não era lágrimas, eram apenas os meus olhos a protestarem pela luz tão intensa da Guiné.
Foi um oásis de ternura, na brutalidade da guerra.     

Mais tarde, uns meses mais tarde, julgo que ainda na Guiné, recebi outra carta, agora com a letra redonda e bem tratada da minha mãe, que me enviava, a pedido da Ti Pedrosa, uma fotografia sua, tirada nos seus oitenta ou noventa anos, que infelizmente a memória já não me deixa lembrar com precisão.

Dizia a minha mãe que a Ti Pedrosa tinha feito questão de tal envio e de que me dissesse da sua grande preocupação que o “benjamim” da família andasse por terras tão estranhas, a fazer coisas tão perigosas. Que me cuidasse muito, tivesse cuidado com as temperaturas e que voltasse depressa e bem.

E porquê esta história agora?
Porque hoje tive uma insónia povoada de sonhos amargos, coisas da Guiné, e no meio da perturbação, da agitação, veio ao meu pensamento, (ou seria ao coração?), a imagem, a lembrança da Ti Pedrosa que lá no Alto olha por mim, tanto que pouco depois adormeci calmamente.

Claro que não podia deixar de lhe fazer esta homenagem, contando os seus gestos de ternura, que tanto amenizaram durante uns tempos, a dureza da minha vida na Guiné.

No meio das emboscadas, das minas, dos tiros, das dores, dos horrores, das horas amargas que aqui neste nosso espaço se vão desfiando, deixo-vos esta lágrima de amor, esta gota de ternura, este gesto de carinho, esta memória, esta emoção, esta gratidão.

Abraço-vos fortemente, meus “camarigos”, com um sorriso nos lábios, porque no peito de todos os combatentes, dos ex-combatentes, endurecidos pela guerra, empedernidos pela morte, ainda bate um coração sensível, que se alegra e enternece com os gestos de carinho, de amor, daqueles que por cá penaram a nossa estadia na Guiné.
 Joaquim Mexia Alves 

segunda-feira, 5 de janeiro de 2015

P591: EM FEVEREIRO DE 1973

A preparação do livro "Nós, Enfermeiras Paraquedistas" iniciou-se há já cerca de dois anos (!) e para o efeito todas nós fomos solicitadas a dar o nosso contributo, fornecendo à equipa coordenadora textos que focassem aspectos que considerássemos importantes da nossa passagem pelo Corpo de Enfermeiras Paraquedistas.
Assim fiz, enviando alguns textos revistos cuja versão original já tinha sido publicada em blogues (caso da Tabanca Grande, Tabanca do Centro e Especialistas da BA12), outros originais, escritos de propósito para o referido livro.
Naturalmente, como podem compreender, evitei utilizar até agora este material, não sabendo o que iria ser integrado definitivamente no nosso livro. Publicado este (o que sucedeu no final de Novembro), estou à vontade para avançar com a publicação de dois ou três textos que não chegaram a ser incluídos na obra. Este é um deles, um texto original escrito há dois anos, que só agora é publicado.
Giselda


Tive um relacionamento próximo com a Enfermeira Celeste em dois períodos diferentes. Frequentámos ambas o mesmo curso de pára-quedismo e partilhávamos os nossos momentos de folia, misturados com algumas pequenas “patifarias” inocentes próprias da nossa juventude.
Separámo-nos momentaneamente após o curso – ela foi para Angola, depois para os Açores, eu segui para Moçambique e mais tarde para a Guiné. Foi aí que em 1972 a Celeste me foi encontrar novamente.
Guardo dela a imagem de uma boa profissional, brincalhona nos momentos certos e sempre boa camarada.
A sua morte ocorre no mesmo dia em que embarco para Lisboa acompanhando um grupo de evacuados. 
O pedido de evacuação surge à hora de almoço e a Celeste avança para o DO-27. Embora não fosse procedimento aprovado o avião já tinha o motor a trabalhar – o que aliás era usual, para diminuir o tempo até à descolagem. 
Nunca se poderá explicar o sucedido, mas o facto é que, depois de ter colocado o material de evacuação na parte traseira do avião, pela porta traseira do lado esquerdo, a Celeste decide passar por baixo do avião – entre o trem dianteiro e o motor (a rodar) – para ocupar o banco da frente (do lado direito) ao lado do piloto.
Pensa-se que poderá ter tido uma desconcentração ou uma falta de equilíbrio, tendo sido atingida pela hélice do DO, o que lhe provocou morte imediata. 
Sem saber do sucedido na Guiné eu tinha entretanto efectuado a minha ida para Lisboa acompanhando os evacuados e como era norma fui apresentar-me na Direcção do Serviço de Saúde, na Avª da Liberdade. Estranhamente o Director não me quis receber, tendo a sua secretária sugerido que eu fosse falar com a minha colega que estava ali colocada. Quando ela me viu, não conseguiu dizer nada, apenas se rindo com um riso esquisito. Quando eu lhe perguntava o que é que se passava continuava a rir-se, não conseguindo falar. Acabou por ser a secretária a informar-me da morte da Celeste. Saí dali meio em choque e apenas me lembro de ter chegado à beira do Tejo, bem longe do AT1 (Portela), onde pretendia dirigir-me para marcar a viagem de regresso à Guiné.
Novamente na Guiné, por mais que uma vez fui interpelada por pessoal que estava plenamente convencido de que eu é que tinha morrido naquele acidente. Isso terá sido devido também ao facto de eu ter arrancado para Lisboa nesse mesmo dia e deixar de ser vista na Base e nos locais onde normalmente me deslocava.
Deu-se o caso de, passados já uns meses, quando num Boeing da FAP regressava à Guiné após uma deslocação a Lisboa, ter sido solicitada para dar apoio a um dos militares assistentes de cabine que repentinamente se tinha sentido mal. 
Recuperado este, ainda pálido da emoção sentida, disse-me que pensava que o acidente tinha sido comigo e que ao longo de todos aqueles meses tinha ficado convencido (pelas conversas com outros) que eu tinha morrido naquele dia.
Como se deve calcular, o piloto envolvido neste acidente ficou bastante abalado com a ocorrência, tendo eu sentido a necessidade de, no dia-a-dia na Base e nos transportes para casa, lhe dar o apoio que sentia ser-lhe necessário, até porque percebemos que ele considerava haver da nossa parte um comportamento mais distanciado após o sucedido. Compreendíamos todas que uma situação como esta apenas sucede a quem lá anda e que era necessário ajudar o piloto a ultrapassar este trauma. Penso que tal foi conseguido pois o piloto em causa acabou por continuar a voar, cumprindo a sua comissão de serviço até ao fim.  

Giselda Pessoa

sexta-feira, 2 de janeiro de 2015

P590: MAIS DO MESMO...

Pelos vistos uma das histórias de farmácias do nosso camarigo JERO, recentemente publicada, despoletou velhas recordações no Juvenal Amado, como ele nos relata neste texto de introdução à sua história:

Esta é uma pequena história contada pelo próprio há alguns anos quando o Félix regressou da sua comissão na Guiné e era eu praticante de pintor na mesma secção da empresa.

Os tempos mudaram e hoje falamos abertamente de coisas que na altura eram praticamente proibidas de mencionar em público.

O JERO conhece bem de quem estou a falar. Não cometo nenhuma inconfidência pois já lá vão mais de 45 anos, talvez, e não me foi pedido segredo desta bem humorada ocorrência.

Juvenal Amado”

HISTÓRIAS DE PHARMÁCIAS

O Félix era aprendiz de pintor na Crisal de Alcobaça e era natural o encarregado mandá-lo fazer pequenos recados, coisa que não desagradava ao jovem, uma vez que andar na rua era bem melhor do que estar na secção a repetir vezes sem fim os mesmos serviços.

Ora ia levar alguma coisa à esposa ou ia buscar o lanche para o chefe, enfim, era o aprendiz mais novo e, por isso, mais à mão de semear para esses pequenos serviços.

Um dia o chefe enviou-o à farmácia buscar uma caixa de preservativos da marca tal, que aliás ele já sabia de cor e salteado, uma vez que era useiro e vezeiro nesse recado.

Na nossa idade lembramos-nos de como era difícil chegar à farmácia e pedir tal “equipamento”. Não era raro vermos homens de parte, assim como quem não quer a coisa, à espera do momento oportuno para pedir ao empregado ou mesmo dono do estabelecimento a famosa e milagrosa caixinha, que evitava inconvenientes ou males maiores nos relacionamentos amorosos.

Ora o nosso herói chegou à farmácia onde era empregada uma senhora e era natural e de bom tom evitar-se pedir os “ditos” a ela; assim que ela via um homem assim de lado, arranjava alguma coisa para fazer lá dentro no armazém, para que a respectiva transacção fosse feita longe dos seus olhares.

Mas do garoto nada disso havia a temer e à pergunta “o que queres, menino?”, logo recebeu o pedido assim a frio - “ quero uma caixa de preservativos da marca tal”. A empregada fez-se encarnada até às orelhas e logo retorquiu que não tinha lá nada disso. O Félix alargou um belo sorriso, pois sabia ele bem onde aquilo estava, disse prazenteiro apontando para a prateleira muito satisfeito por estar a prestar um serviço, “há, há, estão ali”.

Pagou pois já levava o dinheiro à conta e, todo satisfeito, nem se apercebeu dos engulhos que tinha criado.

Hoje os tempos são outros e compram-se em qualquer farmácia ou supermercado sem constrangimentos de maior mas o Félix, sem saber, fez a sua parte na transformação do tabu de então e na alteração dos comportamentos.

Um abraço do

Juvenal Amado