sexta-feira, 19 de outubro de 2012

P269: RECORDAÇÕES DA MEMÓRIA – O POÇO

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No destacamento de Mato Cão, onde estive cerca de uns longos 9 meses, não havia água, que era preciso ir buscar a outro lugar para beber e cozinhar.
Assim o pessoal tomava banho num poço junto ao rio Geba, (servindo-se de uma terrina de sopa da tropa para tirar a água do poço e depois umas “elegantíssimas” latas grandes de conserva, para fazer a vez de chuveiro), no sopé do planalto em que estava instalado o destacamento, de onde a água saía com um aspecto cor e cheiro, comparáveis a qualquer sanita mal lavada!
As muitas queixas de todo o pessoal junto da sede do Batalhão tiveram como resultado uma decisão, quanto a mim inédita nos seus aspectos práticos e eficazes.
Foi enviado um guineense que fazia poços, para o Mato Cão, para proceder à abertura de um dito cujo, em cima no planalto do destacamento.
O homem teria a minha altura, ou até talvez fosse mais alto, se bem me recordo, e sentado sobre as suas pernas, ia abrindo um poço à sua volta, mas com uma perfeição de “corte”, que o círculo do poço parecia feito por uma máquina.
Não sei quantos metros de profundidade alcançou, (mas foram bastantes), nem quantos dias demorou, mas água … nada!
O que era óbvio, pois seria bem difícil que na altura que constituía o planalto, houvesse alguma água, que sem dúvida estaria bem mais abaixo, ao nível do rio Geba!
Lembro-me também que à profundidade a que o homem chegou, o calor dentro do poço era praticamente insuportável!
Continuamos assim na nossa vidinha de sempre, utilizando o poço junto ao rio e trazendo a água para beber, (pouca, porque havia cerveja), e cozinhar, no “burrinho” que apenas conseguia subir para o destacamento em marcha atrás!!!
Se repararem na fotografia que ilustra o nosso blogue, poderão ver uma espécie de “toldo” feito de folhas de palmeira, que cobre o dito poço que estava a ser feito, para ao menos mitigar um pouco do calor, que lá em baixo o homem tinha de suportar.
Monte Real, 19 de Outubro de 2012
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terça-feira, 2 de outubro de 2012

P264: ALBUM DE RECORDAÇÕES - 1

A FORÇA DA NATUREZA...

A propósito das imagens do aquartelamento de Guileje publicadas recentemente no blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné, abarcando o início da década de '70, vieram-me à memória algumas fotos que ali tirei quando da nossa visita (minha e da Giselda) àquele local, integrados numa equipa que em 1995 ali filmou um documentário sobre a retirada de Guileje (filme realizado pelo José Manuel Saraiva).
Uma delas (foto abaixo) mostra a antiga placa de helicópteros, então já inundada de uma vegetação frondosa, fruto de 20 anos de abandono. Vê-se perfeitamente que várias árvores romperam o cimento proporcionando-nos já nessa altura boas áreas de sombra...

Lembrei-me então que 22 anos antes, mais propriamente em 26 de Março de 1973, ali tinha estado pela última vez, aguardando com alguma ansiedade a minha evacuação para Bissau, deitado na maca do AL-III. Para além do pessoal  do aquartelamento que me rodeava, curioso, a placa estava totalmente liberta de obstáculos, como convinha à sua função...


As outras três fotos, também curiosas, testemunham o crescimento de uma árvore através de uma viatura militar ali abandonada (uma Berliet?). A árvore atravessou a estrutura da viatura e só não levantou mais esta porque outra vegetação à volta o impediu... Para se ver a força da natureza! Provavelmente a viatura agora já desapareceu...



PS - As fotos coloridas pertencem ao Miguel Pessoa. A foto a preto e branco é propriedade do nosso camarigo Carlos Santos, que ma disponibilizou - e que eu reproduzo, com a devida vénia.

Miguel Pessoa